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quinta-feira, 18 de março de 2010

Price Earnings na Habitação - II

Na sequência do artigo do passado mês de Fevereiro, ficou uma questão no ar: afinal, o que é que os números nos escondem?

Bem sei que em Portugal, o “apetite” pelo investimento em imobiliário residencial para um mercado de buy-to-let é reduzido, mas o mesmo já não se aplica tanto nos mercados internacionais.

É curioso verificar que uma
notícia emitida a semana passada anunciava que Portugal é dos países da União Europeia com menos casas arrendadas, com apenas 13% do mercado, face a valores acima dos 40% na França, Alemanha, Suécia, Holanda ou Áustria. E temos ainda os 32% nos Estados Unidos…

Significa isto que existe mercado de arrendamento em alguns países da Europa, logo aparenta haver apetência para o investimento neste sector. Mas se temos yields tão baixas, porque se manterá esta apetência de investimento num sector que gera rendibilidades tão baixas?

É verdade que o exercício efectuado centrou-se numa zona de Lisboa (Parque das Nações) mas é replicável para outras zonas da cidade e mesmo para outras capitais europeias. Por exemplo, o Emerging Trends in Real Estate de 2009 apontava o valor de 6,52% para as prime yields residenciais na Europa em Dezembro de 2009 (este valor compara com os 6,36% do nosso caso de estudo, com a devida reserva do Parque das Nações não ser uma zona prime residencial
) e uma expectativa de descida para 6,3% no final de 2010.

Na minha opinião, existem aspectos não quantitativos que têm influência no investimento residencial, tais como:

- A habitação arrendada, tal como a generalidade do commercial real estate, tem uma forte correlação com a inflação. Na realidade, as rendas habitacionais em Portugal estão indexadas ao IHPC, logo à inflação. Isto significa que quando calculamos uma yield de 4%, estamos na prática a dizer que essa rendibilidade é real e não nominal. Se as rendas sobem todos os anos, no mínimo, à taxa anual de inflação, pelo menos esse custo está coberto;

- Por outro lado, a habitação é um bem de primeira necessidade. À partida, existe e existirá sempre procura por imóveis residenciais, todas as pessoas necessitam de uma casa para viver, ao contrário de escritórios e centros comerciais. Esta maior procura neste sector, em comparação com os restantes sectores imobiliários, tem naturalmente algum reflexo numa yield mais reduzida;

- Algum crescimento verificado nos últimos meses na quantidade de oferta de produto para arrendamento está naturalmente relacionado com a maior escassez de financiamento bancário. Esta é uma realidade nossa mas também da generalidade dos países europeus, registando assim alguma “passagem” da função de investimento para os investidores propriamente ditos e não para os bancos.

Bons negócios (imobiliários)!

3 comentários:

João Fonseca disse...

Caro Gonçalo,

As principais razões para o mercado do arrendamento habitacional ser tão reduzido em Portugal são (e por esta ordem):
- congelamento das rendas habitacionais no passado;
- regime legal do arrendamento urbano sempre protegeu os prevaricadores e ainda protege hoje em dia, apesar de todas as evoluções positivas do NRAU;
- sistema judicial muito lento na resolução dos conflitos;
- Até há pouco tempo a banca financiava 100% da aquisição, pelo que as famílias preferiam comprar a casa própria em vez de arrendar.

Actualmente, fruto da crise, de alguma evolução da legislação e da falta de crédito, as pessoas começam a virar-se para o arrendamento como solução para a habitação, o que é uma solução natural e saudável num mercada imobiliário normal.
Qualquer mediador imobiliário reconhece que existe presentemente maior dificuldade em vender imóveis, mas os arrendamentos escoam como "pãezinhos quentes"...

A própria mentalidade dos Portugueses ainda está muito formatada para a compra, quer ao nível dos agregados familiares, quer ao nível dos promotores. Noutros países, há tradição de institucionais a investir em arrendamento habitacional, coisa que em Portugal ainda não sucede... mas havemos de lá chegar.

Um abraço,
João

João Lopes disse...

Boa tarde Gonçalo

Parabéns pelo artigo e pela sua constante busca de inovação no mercado imobiliário/financeiro.
O seu artigo levou-me a reflectir no facto de que a maioria das pessoas quando procuram uma habitação para arrendar, quase que impreterivelmente buscam uma perto do metro. Por isso decidi fazer um exercício semelhante ao do Gonçalo. Recolhi valores de arrendamento e venda de apartamentos T2-T3 da freguesia de S.João (longe do metro) e da freguesia de S.Jorge de Arroios (perto do metro). Estes valores são reais pois constam de uma base de dados que eu compilei com os preços que efectivamente foram pagos pelos imóveis arrendados ou vendidos. Depois de retirar os valores que se afastam numericamente dos outros dados cheguei aos seguintes valores:

Arrendamento
Freguesia S. João – Preço/m2 = 8,1 euros
Freguesia S. Jorge de Arroios – Preço/m2 = 9,4 euros

Venda
Freguesia S. João – Preço/m2 = 1.629 euros
Freguesia S. Jorge de Arroios – Preço/m2 = 2.229 euros

Assim se obtém um price-to-rent ratio de 19,73 para S. Jorge de Arroios e 16,67 para S. João resultando num yield bruto de 5% para S. Jorge de Arroios e 6% para S. João.
Posso concluir assim que revela-se mais vantajoso investir longe do metro, porém pode demorar-se mais tempo a arrendar, o que no meu caso (possuo um imóvel em S.João) nem demorou muito tempo, apenas 1 mês.

Abraço
João Lopes

Gonçalo Nascimento Rodrigues disse...

Olá João (Fonseca)!

É tudo verdade mas parece-me que existe ainda pouca oferta e de baixa qualidade. O aumento do arrendamento deu-se do lado da procura, dos imóveis que estão para venda (sem mercado), poucos são aqueles que estão disponíveis para arrendamento (o que é uma pena).

Mas estou contigo: havemos de lá chegar!

Caro João (Lopes),

Obrigado pelo contributo e por dados adicionais. É curioso ver essa diferença de yields pela localização e proximidade ao metro. Apenas uma chamada de atenção: não sei se é mais vantajoso ou não investir longe do metro só pela yield ser superior. Eu não diria que seria mais vantajoso investir numa junk bond só porque tem um cupão de 11%/12%. Há que nunca esquecer que com a rendibilidade, vem o risco. E no seu caso - bem estruturado - o risco está na distância ao metro. É questão do investidor ponderar se merece a pena correr o risco para auferir mais 1 ponto de yield.

Um abraço a ambos!