Por José Carlos Marques da Silva
Managing Partner da Strategy XXI e Membro do Conselho Consultivo para a Regeneração Urbana da CIP – Confederação Empresarial de Portugal
--
Um dos problemas, ou entraves, fundamentais para dinamizar a regeneração urbana, entre nós, é o de como e através de que vias, se poderá financiar? Neste sentido, ao longo do presente artigo, analisaremos o papel dos Municípios portugueses, e do poder local em geral, em matéria de promoção e financiamento da regeneração urbana. O que será possível e o que seria desejável?
A proximidade do poder local, governos regionais, ou entre nós, dada a nossa tradição administrativa, os Municípios e as Comunidades Intermunicipais, aos agentes económicos e a sua compreensão do território e dos problemas das populações, poderiam eleger este nível da administração como o mais bem posicionado para conduzir as políticas públicas de apoio à regeneração urbana, ou uma boa parte delas, incluindo encontrar, em cada caso, os melhores veículos e instrumentos de financiamento.
Note-se que não deverá ser negligenciado o facto de os Municípios portugueses já desempenharem um papel muito relevante enquanto veículos de disseminação e incentivo, mas também como promotores de iniciativas de regeneração urbana. No entanto, o verdadeiro papel que lhe deveria estar acometido deveria ser muito mais amplo e ambicioso, pois só assim se conseguirá maior cobertura, no terreno, das acções de regeneração e uma maior proximidade e adequação às reais necessidades das populações.
É certo que esta ambição, mais ampla, para o papel a desempenhar pelos Municípios, surge fortemente quartada pela pressão que se faz sentir, quer internacional quer internamente, para a redução da dívida pública, central ou local, traduzida por apertadas restrições orçamentais aos diferentes níveis da administração pública e às nossas autarquias.
As políticas públicas, independentemente dos seus agentes, da Administração central ou local, encontram-se fortemente condicionadas pela escassez de recursos financeiros disponíveis e pela necessidade de uma gestão eficiente e muito selectiva dos parcos recursos que ainda possam existir.
Em particular, cada vez mais é exigido da gestão autárquica que consiga fazer mais, i.e. cobrir novas necessidades, com cada vez menos recursos. Os tempos que vivemos são de uma forte selectividade na escolha e na gestão das prioridades, em matéria de políticas públicas e de financiamento de projectos. É neste quadro, e com estas limitações, que temos de enquadrar as políticas de incentivos à regeneração urbana entre nós e o papel a desempenhar pelos Municípios nesse processo.
Os orçamentos de gestão dos Municípios portugueses, à imagem de muitos outros sectores da vida pública nacional, públicos ou privados, vão sendo reduzidos à medida que o processo de ajustamento estrutural, a que estamos sujeitos, segue o seu curso. Essa redução é imposta por múltiplas vias.
Por um lado, assiste-se a uma diminuição acentuada das transferências da Administração pública central, que se irá certamente agravar ao longo dos próximos exercícios. Por outro, a estrutura tradicional de financiamento dos municípios portugueses, fortemente concentrada nas transferências do Estado, e nas receitas próprias oriundas, no essencial, do licenciamento da actividade imobiliária (que tem sofrido quedas sem precedentes, resultado da crise que o sector imobiliário atravessa) encontra-se em ruptura total. Novos paradigmas e soluções de financiamento do poder local têm de emergir, sob pena de uma parte dos nossos Municípios entrar em situação de insolvência, como será já mesmo a situação de mais de meia centena de Municípios.
Os elevados níveis de fiscalidade, ou de esforço fiscal, a que os portugueses estão sujeitos, a que se junta uma diminuição drástica do rendimento disponível, pela via dos cortes e dos ajustamentos que têm vindo a ser realizados, particularmente nos últimos dois anos, torna quase inviável o lançamento de tributos suplementares, taxas ou impostos, nacionais, ou de base local, ou regional, para financiar as actividades de regeneração ou programas específicos de apoio ao investimento em regeneração urbana, entre nós. Essa capacidade estará irremediavelmente perdida para os próximos anos.
Apesar deste quadro, para um melhor enquadramento das alternativas possíveis, fomos avaliar algumas experiências internacionais. Entre as diferentes tipologias de intervenção, conduzidas pelas Administrações locais, com o objectivo de promoverem projectos públicos estruturantes, com efeitos multiplicadores na economia local e que possam servir de estímulo e exemplo, promovendo um efeito de arrastamento do sector privado, encontramos:
1. Cobrança de direitos de entrada nas cidades, ou zonas específicas das cidades, frequentemente nos seus centros históricos;
2. Aumentos modulares, por zonas e horários, nos preços do aparcamento de viaturas ;
3. Criação de quotas de emissão de CO2;
4. Constituição de fundos de apoio à regeneração urbana, financiados a partir de uma parte dos direitos de poluição alocados aos agentes, públicos e privados;
Note-se que, entre outras especificidades, estes investimentos encerram, quase sempre, um problema de preferências quanto ao horizonte temporal do ciclo de execução/exploração e retorno dos projectos. Os investidores, particulares ou institucionais, preferem, em condições normais, projectos com ciclos e retorno mais curtos (e por conseguinte um risco associado menor) que os normalmente associados aos investimentos em regeneração urbana.
Para alterar essa visão, o desafio passa, necessariamente, por desenvolver e implementar casos ou experiências piloto, que produzam um efeito âncora de demonstração, capazes de mostrar que os investimentos em regeneração, tradicionalmente com ciclos de investimento e de recuperação mais longos, quando adequada e financeiramente bem estruturados, também podem também ser muito atractivos e rentáveis, financeira e estrategicamente.
Na próxima semana escreverei sobre a experiência da Câmara Municipal de Lisboa neste campo.
Managing Partner da Strategy XXI e Membro do Conselho Consultivo para a Regeneração Urbana da CIP – Confederação Empresarial de Portugal
--
Um dos problemas, ou entraves, fundamentais para dinamizar a regeneração urbana, entre nós, é o de como e através de que vias, se poderá financiar? Neste sentido, ao longo do presente artigo, analisaremos o papel dos Municípios portugueses, e do poder local em geral, em matéria de promoção e financiamento da regeneração urbana. O que será possível e o que seria desejável?
A proximidade do poder local, governos regionais, ou entre nós, dada a nossa tradição administrativa, os Municípios e as Comunidades Intermunicipais, aos agentes económicos e a sua compreensão do território e dos problemas das populações, poderiam eleger este nível da administração como o mais bem posicionado para conduzir as políticas públicas de apoio à regeneração urbana, ou uma boa parte delas, incluindo encontrar, em cada caso, os melhores veículos e instrumentos de financiamento.
Note-se que não deverá ser negligenciado o facto de os Municípios portugueses já desempenharem um papel muito relevante enquanto veículos de disseminação e incentivo, mas também como promotores de iniciativas de regeneração urbana. No entanto, o verdadeiro papel que lhe deveria estar acometido deveria ser muito mais amplo e ambicioso, pois só assim se conseguirá maior cobertura, no terreno, das acções de regeneração e uma maior proximidade e adequação às reais necessidades das populações.
É certo que esta ambição, mais ampla, para o papel a desempenhar pelos Municípios, surge fortemente quartada pela pressão que se faz sentir, quer internacional quer internamente, para a redução da dívida pública, central ou local, traduzida por apertadas restrições orçamentais aos diferentes níveis da administração pública e às nossas autarquias.
As políticas públicas, independentemente dos seus agentes, da Administração central ou local, encontram-se fortemente condicionadas pela escassez de recursos financeiros disponíveis e pela necessidade de uma gestão eficiente e muito selectiva dos parcos recursos que ainda possam existir.
Em particular, cada vez mais é exigido da gestão autárquica que consiga fazer mais, i.e. cobrir novas necessidades, com cada vez menos recursos. Os tempos que vivemos são de uma forte selectividade na escolha e na gestão das prioridades, em matéria de políticas públicas e de financiamento de projectos. É neste quadro, e com estas limitações, que temos de enquadrar as políticas de incentivos à regeneração urbana entre nós e o papel a desempenhar pelos Municípios nesse processo.
Os orçamentos de gestão dos Municípios portugueses, à imagem de muitos outros sectores da vida pública nacional, públicos ou privados, vão sendo reduzidos à medida que o processo de ajustamento estrutural, a que estamos sujeitos, segue o seu curso. Essa redução é imposta por múltiplas vias.
Por um lado, assiste-se a uma diminuição acentuada das transferências da Administração pública central, que se irá certamente agravar ao longo dos próximos exercícios. Por outro, a estrutura tradicional de financiamento dos municípios portugueses, fortemente concentrada nas transferências do Estado, e nas receitas próprias oriundas, no essencial, do licenciamento da actividade imobiliária (que tem sofrido quedas sem precedentes, resultado da crise que o sector imobiliário atravessa) encontra-se em ruptura total. Novos paradigmas e soluções de financiamento do poder local têm de emergir, sob pena de uma parte dos nossos Municípios entrar em situação de insolvência, como será já mesmo a situação de mais de meia centena de Municípios.
Os elevados níveis de fiscalidade, ou de esforço fiscal, a que os portugueses estão sujeitos, a que se junta uma diminuição drástica do rendimento disponível, pela via dos cortes e dos ajustamentos que têm vindo a ser realizados, particularmente nos últimos dois anos, torna quase inviável o lançamento de tributos suplementares, taxas ou impostos, nacionais, ou de base local, ou regional, para financiar as actividades de regeneração ou programas específicos de apoio ao investimento em regeneração urbana, entre nós. Essa capacidade estará irremediavelmente perdida para os próximos anos.
Apesar deste quadro, para um melhor enquadramento das alternativas possíveis, fomos avaliar algumas experiências internacionais. Entre as diferentes tipologias de intervenção, conduzidas pelas Administrações locais, com o objectivo de promoverem projectos públicos estruturantes, com efeitos multiplicadores na economia local e que possam servir de estímulo e exemplo, promovendo um efeito de arrastamento do sector privado, encontramos:
1. Cobrança de direitos de entrada nas cidades, ou zonas específicas das cidades, frequentemente nos seus centros históricos;
2. Aumentos modulares, por zonas e horários, nos preços do aparcamento de viaturas ;
3. Criação de quotas de emissão de CO2;
4. Constituição de fundos de apoio à regeneração urbana, financiados a partir de uma parte dos direitos de poluição alocados aos agentes, públicos e privados;
Note-se que, entre outras especificidades, estes investimentos encerram, quase sempre, um problema de preferências quanto ao horizonte temporal do ciclo de execução/exploração e retorno dos projectos. Os investidores, particulares ou institucionais, preferem, em condições normais, projectos com ciclos e retorno mais curtos (e por conseguinte um risco associado menor) que os normalmente associados aos investimentos em regeneração urbana.
Para alterar essa visão, o desafio passa, necessariamente, por desenvolver e implementar casos ou experiências piloto, que produzam um efeito âncora de demonstração, capazes de mostrar que os investimentos em regeneração, tradicionalmente com ciclos de investimento e de recuperação mais longos, quando adequada e financeiramente bem estruturados, também podem também ser muito atractivos e rentáveis, financeira e estrategicamente.
Na próxima semana escreverei sobre a experiência da Câmara Municipal de Lisboa neste campo.
Sem comentários:
Enviar um comentário