Por Ricardo Pereira
inPROP Capital Fund
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A propósito da crise económica que o país
atravessa e do discurso recorrente dos apologistas da austeridade e dos
defensores de políticas expansionistas, eu pergunto-me diversas vezes, qual é o valor da riqueza do
país, afinal?
Sabemos que a dívida
pública é 130% do PIB (e que o PIB de 2012 rondou € 165 mil milhões) e que o
endividamento das famílias é superior a
130%... mas quando se avalia uma empresa não comparamos apenas o valor do
passivo com as vendas, mas acima de tudo, o valor do serviço da dívida com
os resultados operacionais (para se ter uma percepção sobre a
probabilidade de incumprimento) e o valor do passivo com o valor do activo (o
que permite ter uma ideia sobre o valor esperado da perda, havendo
incumprimento). Claro que estas considerações têm de ser enquadradas
no contexto de financiamento a que o país e as famílias têm recorrido e os
riscos, principalmente para os credores externos, de não poderem executar
ordens de liquidação noutras jurisprudências.
Pois bem, recentemente
encontrei um artigo do Banco de Portugal em que são adiantados valores para o valor da
riqueza dos agregados familiares (esta quantificação não considera a riqueza
que é propriedade do Estado). Este artigo é de 2008 pelo que os valores não são
propriamente actuais mas não devem estar longe da realidade actual. Em linguagem contabilística, o balanço das
famílias Portuguesas é apresentado na Figura 1.
Figura 1: Balanço das Famílias Portuguesas (2007)
Fonte: Banco de Portugal
Desta perspectiva, a situação não parece tão dramática, afinal de contas o
rácio de endividamento das famílias é apenas 23%. Contudo, se olharmos para a
evolução do rácio da dívida com o rendimento disponível das famílias, o problema
fica evidente (ver Figura 2).
Figura 2: Evolução dos Rácios de Endividamento
Fonte: Banco de Portugal / Pordata (rendimento disponível)
Ora, endividamento para
aquisição de habitação própria, principalmente quando existe um excedente de 600 mil casas, é não reprodutivo e como tal é um modelo de
endividamento que se esgota em si próprio.
Minsky (a par com Keynes
e Friedman, um dos maiores economistas do século passado), numa das suas
célebres teorias, classifica a dívida como reprodutiva, especulativa e Ponzi. A dívida é reprodutiva se os activos geram retornos capazes de a
amortizar; é especulativa se os activos geram o suficiente para pagar o serviço
da dívida mas não a dívida, sendo necessário estender a maturidade da mesma
sempre que se aproxima do seu termo; é Ponzi se a amortização e o serviço
da dívida estiverem condicionadas pela apreciação do valor dos
activos.
Crédito dirigido para a
aquisição de habitação própria não tem o efeito multiplicador que teria o mesmo
€1 investido no sector produtivo. Não quero com isto
retirar legitimidade ás aspirações dos compradores que precisam de
financiamento para adquirirem casa própria, nem às reivindicações do sector da
construção … mas quem governa o país e estabelece as regras do jogo, deve ter
uma visão mais ampla das necessidades do país e priorizar os sectores de
investimento, o que acabará por acontecer, seja ou não por acção exclusiva dos
governos.
Sendo pouco provável que os bancos
continuem a conceder crédito ao ritmo verificado antes de 2009 e que as
famílias consigam taxas de endividamento tão elevadas como no passado,
parece-me que o sector imobiliário,
principalmente o associado ao residencial, terá de fazer um esforço de reflexão
e de transformação.
Sugiro que se comece pelo óbvio: há 600 mil casas
vazias (o que representa mais de 5 anos de inventário) e um mercado de
arrendamento ineficiente (por diversas razões, que não se prendem apenas com a
qualidade do stock de casas disponíveis). A incongruência destas duas realidades parece-me
óbvia.
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