Por Ricardo da Palma Borges
Advogado (Especialista em Direito Fiscal pela Ordem dos Advogados)
Sócio-Administrador da RPBA (Ricardo da Palma Borges & Associados - Sociedade de Advogados, R.L.)
ricardo@rpba.pt--
Na primeira parte deste texto demonstrámos que o cálculo actual do Valor Patrimonial Tributário (“VPT”) não espelha o valor de mercado resultante de cada fase operacional necessária para que certo prédio rústico se converta em terreno para construção. Defendemos que esta ausência de diferenciação é violadora do princípio constitucional da igualdade por gerar igual tributação de prédios díspares.
Importa assim apurar quais os meios de reacção contra esta patologia ao alcance do contribuinte.
No essencial, o artigo 76.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (“IMI”), permite a segunda avaliação do imóvel quando o VPT esteja distorcido em relação ao valor normal de mercado. O pedido fundamentado de segunda avaliação pode ser requerido dentro de 30 dias após a notificação da primeira avaliação, pelo que há um limite temporal para a reacção do sujeito passivo.
Note-se que só no caso de prédios urbanos se permite a segunda avaliação com este fundamento. Consequentemente, enquanto o prédio rústico não passar a urbano, da espécie terreno para construção (i.e., enquanto não for concedida licença ou autorização de operação de loteamento ou de construção), não se poderá reagir desta forma.
Acresce que, segundo o n.º 5 do mesmo artigo, o VPT só se considera distorcido quando for “(…) superior em mais de 15% do valor normal de mercado, ou quando o prédio apresenta características valorativas que o diferenciam do padrão normal para a zona, designadamente a sumptuosidade, as áreas invulgares e a arquitectura, e o valor patrimonial tributário é inferior em mais de 15% do valor normal de mercado”.
O artigo 77.º do mesmo Código admite a impugnação judicial do resultado das segundas avaliações, com fundamento em “(…) qualquer ilegalidade, designadamente a errónea quantificação do valor patrimonial tributário do prédio”. Por último, o artigo 115.º, também do Código do IMI, permite ainda a revisão oficiosa da liquidação, em resultado de nova avaliação. Porém, ambas estas modalidades pressupõem uma segunda avaliação.
Face a estas limitações, bem como à desejabilidade de distribuir justamente os encargos tributários ex ante (ao invés de querer corrigir ex post por vias administrativas ou judiciais as insuficiências da previsão legislativa, como todos os custos e entropia inerentes), sugerimos uma maior aproximação ao valor efectivo dos prédios, no caso dos terrenos a lotear.
Resulta actualmente do artigo 45.º, n.º 1, do Código do IMI, a seguinte fórmula de cálculo (cujos parâmetros têm o significado referido no n.º 1 do artigo 38.º do mesmo Código):
VPT = Vc x (((Abc + 0,7 x Ab) x Caj) x Ai% + Ac x 0,025 + Ad x 0,005) x Ca x Cl x Cq
O significado das variáveis é o que consta dos artigos 38.º, 39.º e 40.º do referido Código.
Seria assim desejável que a fórmula abrangesse todas as fases intermédias de um terreno para construção. Para tanto, introduzir-se-ia, no seu final, um coeficiente variável correspondente à fase da operação urbanística, a designar por Cf (que designamos por Coeficiente de fase). A sua magnitude seria entre 0 e 0,33, em que 0 corresponderia ao estado de prédio rústico e 0,33 à situação de loteamento, com infra-estruturas executadas e licença a pagamento para os edifícios nele incluídos. Contudo, para se coadunar com a realidade, será necessário fazer a proporção entre os valores resultantes das fórmulas, antes e após a introdução do Cf, i.e., a multiplicação pela proporção: 1/0,33 ≈ 3.
Para a atribuição deste coeficiente, utilizar-se-iam as percentagens definidas no artigo 26.º do Código das Expropriações (Lei n.º 168/99, de 18 de Setembro), para o cálculo do valor do solo apto para construção, substituindo a percentagem inerente à estação de tratamento de águas residuais da alínea g) do n.º 7 pela correspondente aos arranjos exteriores. Deste modo, obtém-se um coeficiente de 25%, ao qual deverá adicionar-se o custo dos projectos dos edifícios que computamos em 8%, resultando assim um Cf máximo de 100% aplicável à fórmula.
Consequentemente, propomos a seguinte fórmula:
VPT = Vc x (((Abc + 0,7 x Ab) x Caj) x Ai% + Ac x 0,025 + Ad x 0,005) x Ca x Cl x Cq x Cf
Face ao exposto, o coeficiente sugerido teria a seguinte variação, consoante a fase da operação urbanística:
Para uma total coerência entre o VPT do terreno e a fase da operação urbanística em que o mesmo se encontra, propõe-se, em conclusão, a seguinte expressão correspondente:
Vpt = Vc x (((Abc + 0,7 x Ab) x Caj ) x Ai% + Ac x 0,025 + Ad x 0,005) x Ca x Cl x Cq x f x Cf
Com o seguinte significado das duas variáveis introduzidas:
f – número da fase da operação urbanística;
Cf – coeficiente correspondente à fase de acordo com a tabela acima.
Deste modo, tutelando as diferentes fases intermédias de “transformação” de um prédio rústico em terreno para construção, alcançar-se-ia um maior grau de aderência aos princípios da igualdade e da tributação do valor real dos imóveis, realizando uma mais justa distribuição dos encargos fiscais. Deixamos pois esta recomendação, ao cuidado do nosso legislador fiscal.
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PS: Agradeço ao Engenheiro Civil e Perito Avaliador Lino da Conceição Claro a ideia para a redacção deste texto bem como as valiosas sugestões e a frutífera troca de opiniões havida sobre o tema.
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