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segunda-feira, 5 de março de 2018

Ainda o β

Prometemos, no último artigo, que voltaríamos ao conceito de β.

Ficou por mostrar a utilidade que o conceito transporta para a estimativa da taxa de atualização, as consequências de uma escolha do β ou do β Total e ainda a opção de considerar na taxa livre de risco uma classificação AAA de Obrigações do Tesouro (por exemplo do Tesouro Alemão) ou escolher as obrigações do Tesouro Português.

Vamos voltar um pouco atrás e salientar que o conceito de taxa de atualização está intimamente ligado aos fluxos de caixa descontados (Discount Cash Flow- DCF). Nesta metodologia, atualizam-se para o momento atual todos os fluxos de caixa de um projeto de desenvolvimento imobiliário.

Quando estimamos a taxa de atualização ou de desconto que aplicamos nos de fluxos de caixa descontados (DCF), muito utilizados na avaliação de património imobiliário, a noção a que mais recorremos é a de custo médio ponderado de capital (weighted average cost of capital - wacc). Assim, a wacc é estimada da seguinte forma:

% capital próprio x custo do capital próprio + % capital alheio x custo do capital alheio

Ou, de outra forma e de acordo com o nosso último artigo:

% capital próprio x (Rf + β x (Rm – Rf)) + % capital alheio x custo do capital alheio

Ao Rf, corresponde a taxa de retorno de investimento sem risco, ao β, a medida de risco sistemático, ao Rm, o risco de mercado e à diferença (Rm – Rf) o prémio de risco de mercado.

Ainda como pressupostos do nosso estudo vamos considerar que estamos a avaliar um projeto de desenvolvimento imobiliário, Real Estate (Development), em Portugal. Como fontes de informação, temos: 

- http://www.stern.nyu.edu/~adamodar/ 
- http://www.investing.com/ 

Os valores de referência obtidos nas fontes de informação mencionadas conduziram-nos aos seguintes pontos de partida para o nosso estudo:


Estimamos ainda que o custo do capital alheio é de 1,56% e que a percentagem de capital alheio no nosso projeto é de 60%. 

A par destes pressupostos, foram estabelecidos quatro cenários para a estimativa da wacc:


Estes cenários permitiram-nos encontrar valores para a wacc de acordo com o quadro seguinte:

Os resultados obtidos conduzem-nos a conclusões interessantes e alertam-nos para alguns cuidados, que demonstram a complexidade da estimativa da wacc e a influência da escolha da noção correta do β.

Claramente, o valor que mais se aproxima da realidade do mercado português é o cenário 3. 

Partindo do princípio que devemos seguir as recomendações do IVSC (International Valuation Standards Council) e que a taxa livre de risco deve corresponder a uma classificação AAA de Obrigações do Tesouro, os cenários a escolher seriam o 1 ou o 3. Em qualquer um deles é exigido um prémio de risco de mercado superior, o que está em linha com a comparação de Portugal com outros países da Europa, onde o mercado de investimento imobiliário é mais maduro. 

Os cenários 1 e 2 são fortemente penalizados pelos valores baixos do β, que não traduzem, de forma alguma, o que se passa no mercado português. Temos de ter consciência que os dados apresentados por Damodaram refletem o universo de 63 empresas europeias, em que o mercado não se assemelhará ao mercado português, tirando eventualmente algumas exceções em Lisboa e Porto. A opção pelo cenário 1 só poderá ser viável se efetuarmos um ajuste ao valor do β por forma a refletir a realidade da envolvente do nosso projeto de desenvolvimento imobiliário.

Ainda relativamente à questão da escolha do β Total transcrevemos parte do artigo “CAPM NA AVALIACÃO DE EMPREENDIMENTOS INDUSTRIAIS: UMA ABORDAGEM PELO BETA TOTAL” de Agnaldo Calvi Benvenho, Engenheiro Mecânico:

“… Antes de se determinar um beta setorial para utilização em empreendimentos industriais, é necessário voltar à discussão sobre a exposição de riscos deste tipo de ativo. 

O beta calculado mede o risco do ativo em relação ao mercado, considerando um investidor diversificado. Entretanto, a hipótese da diversificação é questionável mesmo para carteiras de muitos ativos. Para um investidor pouco diversificado, devem ser considerados os riscos específicos do ativo, e não apenas os riscos de mercado.

Seguindo em nosso exemplo da Societe Vermandoise de Sucreries, considere um investidor não diversificado. O mesmo está exposto aos riscos de mercado e específicos da empresa. Neste caso, o beta correto para este investidor é o beta total, que assim pode ser calculado.(…)”

Numa sociedade como aquela em que vivemos, com maior ou menor regulação, é o mercado que conduz os nossos destinos. E é este que deve sugerir qual o valor correto do β  e da wacc!

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Por João Fonseca
Perito Avaliador de Imóveis

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