Por Ricardo da Palma Borges
Advogado
(Especialista em Direito Fiscal pela Ordem dos Advogados)
Sócio-Administrador
da RPBA (Ricardo da Palma Borges & Associados - Sociedade de Advogados,
R.L.)
ricardo@rpba.pt--
Parte 1 - A suposta afectação habitacional dos terrenos para construção
Assim, a Lei n.º 55-A/2012, de 29 de
Outubro aditou a
verba 28 à Tabela Geral do Imposto do Selo (“IS”), prevendo que a “Propriedade, usufruto ou direito de
superfície de prédios urbanos cujo valor patrimonial tributário constante da
matriz, nos termos do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI), seja
igual ou superior a € 1 000 000 (…)” determinasse
a tributação anual de 1% sobre o VPT dos prédios “com afectação habitacional”.
A “afectação habitacional”, elemento essencial
do IS sobre os supostos “Imóveis de Luxo”, foi uma noção de “última hora”, que
ficou insuficientemente densificada.
Criativamente, a AT considerou
certos terrenos para construção como passíveis de afectação habitacional, conforme
a edificação projectada!
Tal ideia afasta-se do disposto
noutras leis fiscais, atendendo a que, não só para efeitos de aplicação da taxa
reduzida de Imposto sobre o Valor Acrescentado prevista na verba 2.27 da Lista
I anexa ao Código, mas também para efeitos do regime de reinvestimento dos
valores de realização em Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares previsto
no art. 10.º, n.º 5, do respectivo Código, e da isenção de IMI dos prédios
urbanos habitacionais, prevista no art. 46.º do Estatuto dos Benefícios
Fiscais, exige-se sempre uma afectação habitacional real, de facto, e, ainda, que o imóvel afecto à
habitação não esteja licenciado para outros fins.
Lamentavelmente, mesmo após um ofício
do Provedor de Justiça, de Abril de 2013, e consequente parecer do Centro de
Estudos Fiscais e Aduaneiros da AT, proferido ainda em 2013, no sentido da
ilegalidade ou inconstitucionalidade desta tributação, a AT persistiu nas
liquidações.
Gerou-se, naturalmente, uma elevada
litigiosidade sobre o tema, existindo já pelo menos uma decisão dos Tribunais
Tributários de 1.ª instância favorável aos contribuintes. Também várias
decisões do Centro de Arbitragem Administrativa (decisões arbitrais n.º 42/2013, 48/2013, 49/2013 e 53/2013) pronunciaram-se contra a
tributação dos terrenos para construção em IS, por estes não serem passíveis de
afectação habitacional.
Sendo inegável o efeito
potencialmente devastador desta jurisprudência, o legislador aproveitou a Lei do Orçamento do Estado para
2014 para reformular
a verba 28.1 da Tabela Geral do IS, que passou a dispor (sem
eficácia interpretativa ou retroactiva): “Por
prédio habitacional ou por terreno para construção cuja edificação, autorizada
ou prevista, seja para habitação, nos termos do disposto no Código do IMI 1%”.
Os
contribuintes que não reagiram contra este tributo, ainda que os normais prazos
de reacção graciosa e contenciosa já se encontrem excedidos, podem, ao abrigo
do art. 78.º da Lei Geral Tributária, servir-se da revisão oficiosa
com fundamento em erro imputável aos Serviços da AT para discutir as liquidações
de IS referentes a 2012 e 2013. Um eventual indeferimento da revisão oficiosa tem
a virtualidade de abrir a via contenciosa, por impugnação judicial ou pedido de
pronúncia arbitral, permitindo a apreciação do litígio por entidade
independente.
Mas o que
torto nasce muito tarde ou nunca se vai (totalmente) endireitar!
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