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segunda-feira, 4 de junho de 2012

Novas regras no crédito habitação

O Governo encontra-se já a estudar um pacote de novas regras a implementar nos créditos habitação. Na sequência da decisão do Tribunal de Portalegre e da discussão que se lhe seguiu, o Primeiro-Ministro mencionou que o Governo estava a estudar alterações à legislação.

O Grupo Parlamentar do PSD, tal como os restantes grupos parlamentares, apresentou já uma proposta de alteração às regras vigentes no crédito habitação em Portugal, por forma a fazer face às dificuldades crescentes que muitas famílias têm em pagar as suas prestações bancárias. Estamos a falar dos Projectos de Lei nº 237/XII e 238/XII.

Li estes projectos de lei. Li também os projectos do PS (menos abrangentes e julgo eu menos realistas). Li também o que correu na imprensa e ouvi algumas declarações do António Leitão Amaro, que desde já saúdo pela entrega que tem tido no Parlamento em discutir e apresentar propostas relacionadas com o sector imobiliário. E congratulo-me com a abrangência das propostas mas sobretudo com a aplicabilidade prática das mesmas. Parece-me que podem realmente produzir efeito na vida dos Portugueses.



Resumidamente, o PSD propõe:

- Impossibilidade do Banco aumentar o spread, unilateralmente, em caso de mobilidade geográfica por efeitos de emprego, desemprego, divórcio ou viuvez;

- Impossibilidade do Banco aumentar o spread, unilateralmente, no caso em que um mutuário desempregado ou com proposta de emprego noutro local diverso da sua residência, queira e possa arrendar a sua casa;

- Possibilidade de saldar a totalidade da dívida com entrega da casa ao Banco, desde que o valor actual da avaliação, acrescido do valor entretanto já amortizado, seja superior o montante emprestado, para imóveis com um Valor Patrimonial Tributário (VPT) até € 250.000;

- Implementação de um regime extraordinário «para as pessoas mesmo necessitadas», obrigando o Banco a reestruturar a dívida antes de executar a casa. Mesmo que a reestruturação da dívida não seja viável, deve o Banco procurar arrendar-lhe a mesma casa, uma outra ou proceder a uma troca de casa. A execução é sempre o último recurso.

Esta última proposta é muito similar àquilo que foi implementado na Islândia desde 2009, com bastante sucesso, contemplando negociações case-by-case que incluíam redução de spreads, períodos de carência, perdão parcial da dívida, entre outros.

Permitam-me partilhar convosco algumas preocupações:

- Como se fiscalizará a aplicação da lei? Por exemplo, como se fiscaliza que o Banco efectivamente tenha diligenciado junto do mutuário a apresentação de um plano de reestruturação da dívida?

- Porquê impedir o Banco de alterar o spread ou outras condições do crédito em caso de divórcio? Não entendo porque é que uma situação de divórcio deve ser beneficiada. E podemos correr o risco de haver um surto de divórcios fictícios para aproveitamentos fiscais sem consequências no crédito habitação...

- O tecto de 45% para determinação da renda máxima a pagar, no caso do mutuário passar a ser arrendatário, parece-me excessivo, principalmente se não tiver havido lugar à reestruturação de outros eventuais créditos.

Permitam-me, ainda, adicionar mais algumas propostas:

- Constituição de um Gabinete de Apoio ao Endividamento, com o objectivo de prestar esclarecimentos e ajudar as famílias endividadas a procurar possíveis soluções e auxiliá-las a negociar com os Bancos (da leitura dos projectos lei, fiquei com a ideia que iria ser constituído a Rede Nacional de Informação e Apoio ao Consumidor Endividado mas ainda sem legislação específica);

- Algo que há muito "reclamo", a isenção de mais-valias na venda de habitação própria e permanente, em caso de reinvestimento das mesmas em contrato de arrendamento de longo prazo (pelo menos, 3 anos);

- Por fim, julgo que a toda e qualquer família que recorra a este regime extraordinário ou que decida efectuar uma dacção em pagamento, lhes deveria ser vedado o acesso a qualquer tipo de crédito durante um determinado prazo, enfrentando assim um "período de nojo". Há aqui também a oportunidade de co-responsabilizarmos as famílias endividadas e de promovermos alguma educação financeira junto delas.

Última nota para um ponto que me chamou à atenção no Projecto Lei nº 222/XII do Grupo Parlamentar do PS. Este propõe que seja possível a uma família com mais de 1 dependente, efectuar uma dacção em pagamento desde que, entre outros pontos, não tenha um rendimento mensal bruto superior a € 2.933. São mais de € 40 mil /ano! Desculpem-me mas quem ganha € 40.000 /ano estará a passar dificuldades se tiver contraído vários créditos. Aqui não existe tanto ou só responsabilidade do Banco mas também total irresponsabilidade dessas famílias. Acho que estes casos não têm de ser beneficiados e não são estas as pessoas efectivamente com necessidades urgentes.

Bons negócios (imobiliários)!

2 comentários:

Anónimo disse...

Caro Gonçalo,

Há muito afastado deste fórum permite-me só um comentário à questão do aumento dos spreads.

Os contratos de hipoteca que estão assinados devem ser cumpridos mas confesso que não entendo como é sequer possível prever aumentos de spread com origem em simples alterações que não lesem as entidades bancárias.

Retirando a questão do arrendamento, porque efectivamente se trata da constituição de um ónus ao bem hipotecado, se o mutuário não incumprir mensalmente para com o banco porque há-de ver o seu spread ser alterado só porque perde o emprego, a mulher ou o marido?

E já agora no caso em concreto do divórcio ajuda-me a perceber uma coisa: se este projecto lei prevê que os bancos deixem de poder aumentar o spread nestes casos, qual seria a finalidade do “Divórcio fictício” para aproveitamentos fiscais sem consequências no crédito à habitação?

Existe a possibilidade de um aproveitamento fiscal por via do divórcio que só é travado perante a ameça de aumento do spread?

Um grande abraço,

Ricardo Roquette.

Gonçalo Nascimento Rodrigues disse...

Caro Ricardo,

Bem vindo de volta! Há muito que andavas afastado destas "lides"...

Não sei bem se entendi a tua pergunta mas parece-me que, em parte, estamos os 2 a dizer mais ou menos a mesma coisa: se os contratos são para cumprir, porquê então essa "exclusão"? Que facto especial ocorre para que as pessoas divorciadas possam ter uma condição "preferencial na lei"?

O que muda num divórcio? Provavelmente, o facto do casal já não querer a casa. O que faz? Tenta vender? A quem e por quanto? Boa pergunta!

Não sei bem o que esteve na mente do legislador mas julgo que terá sido o caso de Portalegre. Para precaver mais situações dessas, toca de pôr uma excepção na lei.

Mas se, porventura, algum mutuário "prevaricar" e não estiver contemplado nas excepções da lei, será que o divórcio ajudará? É essa a minha questão. Havendo, porventura, casais que se divorciem por questões meramente fiscais, ora aqui está mais uma pequena ajuda.

Mas volto a frisar, não entendo o porquê deste benefício. olhemos a questão ao contrário: um casal casado, trabalhador, esforçado, poupado, austero... O que é que o Estado lhe dá? Impostos! Um casal divorciado, desempregado, endividado... O que é que o Estado lhe dá? Spreads baixos, carências, rsi's...

Acho que premiamos sempre as pessoas erradas em Portugal, mas enfim...


Abraço.