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segunda-feira, 9 de julho de 2018

Reflexões sobre a Bolha Imobiliária: 7 anos depois

Nos últimos meses, inúmeras notícias têm sido publicadas sobre a bolha imobiliária em Portugal. Ora, em 2011, antes do resgate do FMI mas quando já era claro que Portugal iria passar por dificuldades de financiamento eu escrevi um artigo aqui sobre a bolha imobiliária em Portugal, onde mencionei que seria de esperar uma correcção de pelo menos 30% para que o rácio de afordabilidade regressasse a níveis sustentáveis (tendo em consideração informação de Dezembro de 2010; a correcção de 15% verificada entre 2007 e 2009 está relacionada com a crise de crédito de 2008).

Passados 2 anos, em 2012, os preços tinham corrigido 27% (ver Figura 1). Desta vez estive certo mas outras vezes houve em que estive errado. Por exemplo, no mesmo artigo referi que o Reino Unido também estava em território de bolha e nada aconteceu desde então. 

Figura 1 – Índice do valor médio dos prédios transaccionados (1992 = 100)

Fonte: Pordata

Isto leva-nos à primeira máxima do investimento: os mercados podem manter-se irracionais mais tempo do que qualquer um de nós pode permanecer solvente (principalmente se os bancos centrais estiverem envolvidos no processo), sendo a previsão do rebentamento de uma bolha um exercício de timing muito complicado.



Regressando a Portugal, é verdade que desde 2013 a recuperação do imobiliário tem sido notável mas será o suficiente para a classificar de bolha? Talvez não.

Tendo em consideração que tudo é relativo e que as obrigações de tesouro a 10 anos e o PSI 20 estão a oferecer 3% e 4% (o rácio price/earnings do PSI20 é 25), respectivamente, o imobiliário, com taxas de rendibilidade na ordem dos 5%, segundo dados recentes, parece um bom investimento. Pese embora que o grau de liquidez de um investimento em imobiliário é muito diferente de um investimento em acções ou obrigações. (Não se incluem nestes imóveis, as zonas premium de Lisboa e Porto, em que as rental yields são inferiores a 5% e em alguns casos próximas de 3%. Mas este é mais um problema de desequilíbrio entre a oferta e procura de imóveis, procura esta que é estrangeira e que tende a financiar-se com pouca divída, tendo por isso um impacto reduzido no risco do sistema financeiro).

Contudo, se olharmos para os valores do índice de afordabilidade, pois estão próximos dos níveis observados em 2006 (ver Figura 2), a conclusão não é tão óbvia. Dois factores têm contribuído para esta evolução: as taxas Euribor estarem em níveis historicamente baixos e os bancos terem começado a conceder crédito. A combinação destes dois factores significa que os compradores podem contrair empréstimos maiores sem aumentarem o rácio de esforço e, consequentemente, licitar mais pelos imóveis.

Figura 2 –  Índice de Afordabilidade: Portugal
Fonte: Pordata (Valor médio dos prédios e Valor médio do rendimento bruto dos agregados)

Com efeito, não seria a primeira vez que crédito abundante e barato se tornaria a origem de uma bolha imobiliária. Mas ao contrário do observado em 2007, há alguma racionalidade desta vez.

A Figura 3 apresenta as opções do comprador: comprar vs arrendar; e o pagamento mensal de cada uma destas opções (assume-se uma rental yield de 5% e a taxa de juro do empréstimo de 2% com empréstimo a 25 anos e com um loan-to-value de 95%)

Figura 3 –  Pagamento mensal do potencial comprador

Ora, entre pagar € 833 ao senhorio pelo usufruto apenas do imóvel e € 805 pelo usufruto e propriedade, em que a componente de propriedade representa €5.700 por ano (€475 * 12 meses) ou 2,8% do valor do imóvel/ano, é fácil perceber porque se tem optado pela compra e não pelo arrendamento.

Acresce que se o tempo médio de permanência no mesmo imóvel for de 7 anos, o comprador ganha uma almofada de quase 20% (2,8% * 7 anos) à desvalorização do imóvel.

O único problema deste exercício (e é um grande problema) é que se assume que as taxas de juro permanecerão aos níveis actuais nos próximos 7 anos, visto que o modelo actual de financiamento é maioritariamente Euribor 6M + spread e não taxa fixa a 5 ou mais anos. Ora, o benefício da opção de compra facilmente se transforma em prejuízo se as taxas de juro aumentarem para os níveis pré-crise de 2007, com o prejuízo acrescido que o valor das casas também cairá se for o caso.

Muitos analistas acreditam que os ciclos económicos estão a ser substituídos por ciclos monetários e que os bancos centrais tentarão sempre controlar a economia através da manutenção das taxas de juro aos níveis actuais e/ou através da compra de dívida no mercado secundário. Se este for o caso, então a estratégia de indexação dos empréstimos a taxas de curto-prazo é razoável, caso contrário, a solução deverá passar pela fixação da taxa de juro, o quanto antes. (Acresce que, embora o Banco Central Europeu tenha mantido a taxa de referencia nos 0%, já anunciou o fim do programa de compra de dívida corporativa o que poderá ser o início do fim do programa iniciado após 2011).

Num contexto duma exposição de longo-prazo, em que é muito difícil antecipar atempadamente o rebentamento de uma suposta bolha, resta mitigar o risco de perdas e aumentar a probabilidade de permanecer solvente enquanto o mercado se mantém irracional.

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Por Ricardo Pereira
InProp Capital Fund

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