António Pena do Amaral deu uma entrevista a Out of the Box que aqui se publica na íntegra.
A opinião e ponto de vista de todos os que intervêm no mercado imobiliário e financeiro é muito importante para todos nós.
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Gonçalo Nascimento Rodrigues (GNR): Que leitura faz da actual crise? Qual foi a sua origem? Quais as consequências esperadas para a economia nacional e mundial?
António Pena do Amaral (APA): Este assunto tem sido tratado até à exaustão e aos mais diversos níveis. Ao que tudo indica a origem terá estado mais uma vez no sector imobiliário, sendo que desta vez terá sido o lastro de uma mistura explosiva, composta por dinheiro (muito) barato, falta de escrúpulos, falta de bom-senso, ganância e excesso de ignorância.
Julgo que as consequências são já visíveis, sendo a sua dimensão e profundidade ainda imprevisíveis. Pior do que os danos materiais de uma dimensão colossal e ainda em fase de contabilização, são os danos morais e psicológicos, com implicações bem mais profundas e para cuja recuperação será necessária uma terapia mais complexa. Neste caso acho que o factor tempo será fundamental para ajudar a “esquecer” o que se passou, para que um dia possa acontecer tudo de novo. Entretanto as consequências estão aí à vista de toda a gente, com a recessão a deixar de ser um espectro, para passar a ser uma realidade.
GNR: Qual estima ser o impacto (actual e futuro) na indústria dos FII em Portugal?
APA: Vou-me cingir aquilo que entendo ser a realidade dos fundos abertos.
O impacto actual está aí para quem o quiser ver, com os fundos a sofrerem níveis de resgates nunca antes alcançados desde a criação desta indústria em Portugal, tendo tido como consequência imediata níveis de endividamento igualmente inéditos.
As razões que levaram a este estado de coisas terão sido várias: a subida das taxas de juro, entretanto já corrigida, o desconhecimento da realidade por parte de quem investe nestes produtos, a onda de histeria que se criou à volta de qualquer produto que tivesse a palavra “imobiliário” no seu nome e a concorrência “oportunística” mas muito pontual, de produtos de muito baixo risco, concretamente dos depósitos a prazo.
Entretanto as coisas acalmaram, quer porque as taxas de juro e de remuneração dos depósitos baixaram, quer porque os investidores nestes produtos se terão apercebido de que nada de extraordinário, no mau sentido, aconteceu entretanto.
Diria que, se tudo ficasse por aqui, teríamos passado só por um mau período. Mas receio que não seja assim tão simples, pois é natural que a 2ª onda de choque, esta com contornos bem mais reais, esteja agora a chegar. Refiro-me naturalmente à situação económica e ao seu impacto no imobiliário, quer pelo aumento das taxas de desocupação (imóveis devolutos), quer dos incumprimentos, devido às maiores dificuldades em honrar compromissos, nomeadamente o pagamento de rendas. Escamotear esta perspectiva, seria escamotear a realidade e como tal uma prova de grande irresponsabilidade. No entanto, estamos convictos de que a indústria dos FII’s poderá sobreviver e ultrapassar mais esta dificuldade. Mas esta convicção não tem origem somente em fé ou esperança, sempre importantes, embora estrategicamente pouco eficazes, mas sim da leitura que faço daquilo que é, e tem sido, o mercado imobiliário nacional.
Em primeiro lugar o nosso mercado (excluindo habitação) pouco ou nada se valorizou nos últimos anos, pelo que não se assistiu à formação de uma bolha especulativa, antes pelo contrário. Daqui resulta a convicção de que haverá pouco espaço adicional para o mercado cair. Por este facto não antecipo perdas de capital significativas. Por outro lado, os fundos têm como objectivo a diversificação do risco, pelo que não será expectável que todos os arrendatários em todos os sectores incumpram, ou encerrem a sua actividade, e como tal deverá ser possível aos fundos manterem níveis de rendibilidade minimamente competitivos. Neste contexto, a concorrência mais fraca por parte de produtos supostamente concorrentes (em termos de rendibilidade imediata), deverá ajudar à manutenção e até à captação de novos investidores para os FII’s. Naturalmente que aquilo que aqui afirmo deverá ser visto em termos médios, pois terá havido ao longo dos últimos anos fundos com posturas mais agressivas (logo mais expostos a esta crise) e outros mais conservadores (logo mais defendidos).
GNR: Quais as principais alterações (se alguma) que prevê virem a ocorrer no mercado imobiliário em Portugal nos próximos tempos?
APA: Depende de que alterações estejamos a falar. Em termos de dinâmica, parece-me óbvio que iremos atravessar um período de grande acalmia, para não dizer mesmo de estagnação, mas com graduações diferentes consoante os segmentos em causa. Parece-me assim que a habitação e o retalho, nomeadamente os conceitos de maior dimensão, deverão ser os mais atingidos.
GNR: Que estratégias tem a F&C procurado implementar para fazer face ao momento actual?
APA: A F&C Portugal, enquanto entidade especializada na consultoria de fundos imobiliários, entende que a primeira preocupação em alturas como esta, será a de manter a calma na medida do possível. Mas manter a calma não significa ficar parado à espera que a crise passe. Ter calma significa não entrar em pânico e estar muito atento à realidade e aos mínimos sinais que nos vão chegando, um pouco de todo o lado.
Se bem que a crise esteja aí, o País e o Mundo não pararam. Assim e no que diz respeito ao mercado de arrendamento, continua a assistir-se a alguma procura de espaços, nomeadamente de lojas e escritórios, nem que seja por parte de empresas que procuram espaços mais pequenos e/ou mais baratos, como forma de reduzirem custos. Neste contexto, aliado à falta de liquidez generalizada, será certamente mais proveitoso a concentração de todos os esforços na rentabilização do património imobiliário existente, ao invés da análise de negócios de aquisição.
GNR: Que leitura faz das medidas mais concretas tomadas pelo nosso Governo, nomeadamente da criação dos FIIAH?
APA: Julgo que só haverá uma leitura possível, ou seja, que por detrás da criação dos FIIAH estarão preocupações de outra natureza, que não propriamente a da criação de um produto alternativo de poupança ou de dinamização do mercado de arrendamento habitacional. Dito de outra forma, considero muitíssimo improvável que estes fundos venham a cumprir a sua missão de captação de poupança. Esta convicção baseia-se em dois dados concretos: a leitura da Portaria n.º 1553-A/2008 e a manutenção da lei do arrendamento ou, mais importante do que a lei, a manutenção da complexidade e tempo que uma simples acção de despejo, por incumprimento ou desrespeito de um contrato, pode demorar.
GNR: O que acha que poderia (ou deveria) ser feito para estimular ou dinamizar um pouco mais o mercado imobiliário em Portugal?
APA: Não me ocorre nenhuma poção mágica nesta altura, ou seja, parece-me difícil estimular o mercado enquanto se mantiver esta situação de falta de liquidez. Mas tudo o que puder ser feito em prol do sector ajuda-lo-à certamente, nem que seja à criação de condições para uma retoma mais rápida.
As medidas possíveis são várias e vão desde as que se prendem com a transparência e celeridade nas tramitações burocráticas (a todos os níveis, mas sobretudo as camarárias), até à sempre eficaz “receita” do subsídio ou benefício fiscal. No entanto, existe um segmento de mercado que pelos piores motivos, tem mostrado ultimamente um dinamismo inusitado e que é o mercado de arrendamento habitacional. Digo pelos piores motivos, porque quem coloca as suas casas no mercado age em desespero de causa.
Como se sabe, nada foi feito até hoje no sentido de conferir aos proprietários um mínimo de garantias perante um arrendatário faltoso, pelo que ainda hoje arrendar uma habitação se aproxima muito de uma autêntica lotaria. Não fora este “pequeno” detalhe e poderíamos estar perante uma oportunidade séria de dinamização daquele que é certamente o maior segmento do mercado imobiliário – o habitacional - e que por si só encerra um potencial de negócio imenso.
GNR: Se fosse um investidor ou promotor imobiliário, que decisões/estratégias estaria a tomar neste momento?
APA: Estaria a suspender ou a abrandar o ritmo de execução dos projectos onde isso fosse possível e a concluir aqueles que tivesse que concluir. Isto em termos gerais e dependendo naturalmente das perspectivas de colocação dos produtos no curto-prazo. Por outro lado e como investidor, estaria naturalmente atento a oportunidades que possam surgir, privilegiando as operações de rendimento.
GNR: E enquanto gestor de fundos imobiliários, que conselhos dá (daria) aos detentores das UP’s das carteiras que gere?
APA: A esta pergunta é muito difícil responder com total isenção, pois a minha resposta será naturalmente suspeita. Partirei também do princípio de que estaremos a falar de investidores de médio/longo prazo, conhecedores do mercado imobiliário e do produto onde estão investidos. Estas premissas são muito importantes, pois caso contrário seria muito complicado estar aqui a explicar a enorme diferença que existe entre investir num FII (neste caso aberto) e um DP, por exemplo.
Assim e em termos gerais não resgataria a participação nos fundos, quer pela falta de alternativas, quer pela baixa volatilidade que estes apresentam. Mas à falta de melhores argumentos, julgo que será perfeitamente legítimo olhar para trás e comparar aquele que foi o desempenho dos FII’s em geral (índice APFIPP) e o das restantes classes de activos.
A 3 e a 8 anos, em termos de retorno líquido de impostos, o índice APFIPP (que é igualmente líquido das comissões de gestão e de depositário) bate a generalidade dos principais índices de acções (PSI 20 e Eurostoxx geral) e de obrigações (EFFAS), bem como aquele que seria o retorno de um DP a 3 meses aplicado à taxa Euro Libor a 3 meses, renovável ao longo desse período.
GNR: Acha que a legislação actual dos Fundos de Investimento Imobiliário permite aos gestores de carteiras protegerem-se devidamente contra estes tempos de crise e baixa no mercado? Se não, o que acha que está em falta?
APA: Em termos gerais a legislação actual padece de uma má formação de nascença, decorrente do facto de ter sido decalcada da legislação que rege os fundos mobiliários, mesmo apesar das sucessivas alterações que foi sofrendo ao longo dos anos. Diria que às próprias autoridades lhes falta ainda sensibilidade relativamente à realidade que é a gestão de activos imobiliários. E essa falta de sensibilidade é colmatada muitas vezes, infelizmente, através da proibição de determinadas operações, tudo em prol da defesa dos interesses dos participantes.
Aquilo que acharia desejável seria uma maior flexibilidade na gestão dos activos dos fundos, desde que fosse possível demonstrar as vantagens dessas medidas para os participantes em geral. Refiro-me concretamente à não proibição de transacções de imóveis entre FII’s geridos pela mesma sociedade gestora e à possibilidade de se ultrapassarem os limites impostos nos rácios. Mas como nada de verdadeiramente grave aconteceu entretanto, a leitura que irá ser feita certamente, é de que está tudo bem, pelo que não será necessário alterar o que quer que seja.
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António Pena do Amaral é Administrador da F&C Portugal e responsável pelo pelouro imobiliário. Está na empresa há mais de 7 anos.
A F&C Portugal, Gestão de Patrimónios, SA é uma subsidiária detida a 100% pela britânica F&C Asset Management, plc. Dedica-se a 100% à gestão de activos e para além do Reino Unido (Londres e Edimburgo), tem escritórios na Holanda, França, Portugal, Irlanda, Alemanha, EUA, China (Hong-Kong), Escandinávia e Suíça. Para além dos mercados desses países, está ainda presente na Áustria, Nova Zelândia e Espanha.
A 31 de Dezembro geria um total de €102 mil milhões (£98,6 mil milhões), dos quais €8,1 mil milhões em imobiliário (directo e indirecto).
Para os fundos imobiliários, a F&C Portugal actua como consultora de uma sociedade gestora de fundos imobiliários colocados maioritariamente em clientes institucionais e da rede de private banking. Nesse contexto estão incluídos dois fundos, sendo um aberto e outro fechado.
O primeiro fundo, aberto, é um fundo “core” que investe em quase todos os segmentos de mercado, com excepção da habitação. A 31 de Dezembro detinha 110 imóveis ou partes de imóveis, sendo 48.5% destinados a serviços, 27% a comércio, 15,2% a armazéns e indústria e o restante são projectos e terrenos. Em termos geográficos, 57% do seu património concentra-se na região da Grande Lisboa, 13,8% no Grande Porto e o remanescente (29,3%) noutras regiões.
O segundo fundo é um fundo fechado com vocação para o investimento em projectos turísticos e reabilitação urbana. No que respeita aos primeiros (projectos turísticos), está em fase muito adiantada um projecto no Algarve, totalizando 36.000 m² de construção repartidos por 2 hotéis e 1 aldeamento turístico. Relativamente aos segundos (reabilitação urbana) o fundo está ainda em fase de aquisição de um quarteirão na cidade do Porto, onde se prevê a construção de 22.000m² repartidos por comércio, habitação, podendo ainda vir a albergar serviços e/ou hotel e um parque subterrâneo para 760 lugares.
A 31 de Dezembro de 2008 o fundo aberto detinha cerca de €356 milhões em património imobiliário e um património líquido de €310 milhões. O fundo fechado tinha cerca de €57 milhões de capital, dos quais cerca de €37 milhões em imobiliário.
O fundo aberto tem cerca de 2.500 participantes, sendo na sua maioria (em termos de montantes) clientes institucionais (Seguradoras, Fundos de Pensões e outros). Existe também um número significativo de clientes do segmento alto.
António Pena do Amaral (APA): Este assunto tem sido tratado até à exaustão e aos mais diversos níveis. Ao que tudo indica a origem terá estado mais uma vez no sector imobiliário, sendo que desta vez terá sido o lastro de uma mistura explosiva, composta por dinheiro (muito) barato, falta de escrúpulos, falta de bom-senso, ganância e excesso de ignorância.
Julgo que as consequências são já visíveis, sendo a sua dimensão e profundidade ainda imprevisíveis. Pior do que os danos materiais de uma dimensão colossal e ainda em fase de contabilização, são os danos morais e psicológicos, com implicações bem mais profundas e para cuja recuperação será necessária uma terapia mais complexa. Neste caso acho que o factor tempo será fundamental para ajudar a “esquecer” o que se passou, para que um dia possa acontecer tudo de novo. Entretanto as consequências estão aí à vista de toda a gente, com a recessão a deixar de ser um espectro, para passar a ser uma realidade.
GNR: Qual estima ser o impacto (actual e futuro) na indústria dos FII em Portugal?
APA: Vou-me cingir aquilo que entendo ser a realidade dos fundos abertos.
O impacto actual está aí para quem o quiser ver, com os fundos a sofrerem níveis de resgates nunca antes alcançados desde a criação desta indústria em Portugal, tendo tido como consequência imediata níveis de endividamento igualmente inéditos.
As razões que levaram a este estado de coisas terão sido várias: a subida das taxas de juro, entretanto já corrigida, o desconhecimento da realidade por parte de quem investe nestes produtos, a onda de histeria que se criou à volta de qualquer produto que tivesse a palavra “imobiliário” no seu nome e a concorrência “oportunística” mas muito pontual, de produtos de muito baixo risco, concretamente dos depósitos a prazo.
Entretanto as coisas acalmaram, quer porque as taxas de juro e de remuneração dos depósitos baixaram, quer porque os investidores nestes produtos se terão apercebido de que nada de extraordinário, no mau sentido, aconteceu entretanto.
Diria que, se tudo ficasse por aqui, teríamos passado só por um mau período. Mas receio que não seja assim tão simples, pois é natural que a 2ª onda de choque, esta com contornos bem mais reais, esteja agora a chegar. Refiro-me naturalmente à situação económica e ao seu impacto no imobiliário, quer pelo aumento das taxas de desocupação (imóveis devolutos), quer dos incumprimentos, devido às maiores dificuldades em honrar compromissos, nomeadamente o pagamento de rendas. Escamotear esta perspectiva, seria escamotear a realidade e como tal uma prova de grande irresponsabilidade. No entanto, estamos convictos de que a indústria dos FII’s poderá sobreviver e ultrapassar mais esta dificuldade. Mas esta convicção não tem origem somente em fé ou esperança, sempre importantes, embora estrategicamente pouco eficazes, mas sim da leitura que faço daquilo que é, e tem sido, o mercado imobiliário nacional.
Em primeiro lugar o nosso mercado (excluindo habitação) pouco ou nada se valorizou nos últimos anos, pelo que não se assistiu à formação de uma bolha especulativa, antes pelo contrário. Daqui resulta a convicção de que haverá pouco espaço adicional para o mercado cair. Por este facto não antecipo perdas de capital significativas. Por outro lado, os fundos têm como objectivo a diversificação do risco, pelo que não será expectável que todos os arrendatários em todos os sectores incumpram, ou encerrem a sua actividade, e como tal deverá ser possível aos fundos manterem níveis de rendibilidade minimamente competitivos. Neste contexto, a concorrência mais fraca por parte de produtos supostamente concorrentes (em termos de rendibilidade imediata), deverá ajudar à manutenção e até à captação de novos investidores para os FII’s. Naturalmente que aquilo que aqui afirmo deverá ser visto em termos médios, pois terá havido ao longo dos últimos anos fundos com posturas mais agressivas (logo mais expostos a esta crise) e outros mais conservadores (logo mais defendidos).
GNR: Quais as principais alterações (se alguma) que prevê virem a ocorrer no mercado imobiliário em Portugal nos próximos tempos?
APA: Depende de que alterações estejamos a falar. Em termos de dinâmica, parece-me óbvio que iremos atravessar um período de grande acalmia, para não dizer mesmo de estagnação, mas com graduações diferentes consoante os segmentos em causa. Parece-me assim que a habitação e o retalho, nomeadamente os conceitos de maior dimensão, deverão ser os mais atingidos.
GNR: Que estratégias tem a F&C procurado implementar para fazer face ao momento actual?
APA: A F&C Portugal, enquanto entidade especializada na consultoria de fundos imobiliários, entende que a primeira preocupação em alturas como esta, será a de manter a calma na medida do possível. Mas manter a calma não significa ficar parado à espera que a crise passe. Ter calma significa não entrar em pânico e estar muito atento à realidade e aos mínimos sinais que nos vão chegando, um pouco de todo o lado.
Se bem que a crise esteja aí, o País e o Mundo não pararam. Assim e no que diz respeito ao mercado de arrendamento, continua a assistir-se a alguma procura de espaços, nomeadamente de lojas e escritórios, nem que seja por parte de empresas que procuram espaços mais pequenos e/ou mais baratos, como forma de reduzirem custos. Neste contexto, aliado à falta de liquidez generalizada, será certamente mais proveitoso a concentração de todos os esforços na rentabilização do património imobiliário existente, ao invés da análise de negócios de aquisição.
GNR: Que leitura faz das medidas mais concretas tomadas pelo nosso Governo, nomeadamente da criação dos FIIAH?
APA: Julgo que só haverá uma leitura possível, ou seja, que por detrás da criação dos FIIAH estarão preocupações de outra natureza, que não propriamente a da criação de um produto alternativo de poupança ou de dinamização do mercado de arrendamento habitacional. Dito de outra forma, considero muitíssimo improvável que estes fundos venham a cumprir a sua missão de captação de poupança. Esta convicção baseia-se em dois dados concretos: a leitura da Portaria n.º 1553-A/2008 e a manutenção da lei do arrendamento ou, mais importante do que a lei, a manutenção da complexidade e tempo que uma simples acção de despejo, por incumprimento ou desrespeito de um contrato, pode demorar.
GNR: O que acha que poderia (ou deveria) ser feito para estimular ou dinamizar um pouco mais o mercado imobiliário em Portugal?
APA: Não me ocorre nenhuma poção mágica nesta altura, ou seja, parece-me difícil estimular o mercado enquanto se mantiver esta situação de falta de liquidez. Mas tudo o que puder ser feito em prol do sector ajuda-lo-à certamente, nem que seja à criação de condições para uma retoma mais rápida.
As medidas possíveis são várias e vão desde as que se prendem com a transparência e celeridade nas tramitações burocráticas (a todos os níveis, mas sobretudo as camarárias), até à sempre eficaz “receita” do subsídio ou benefício fiscal. No entanto, existe um segmento de mercado que pelos piores motivos, tem mostrado ultimamente um dinamismo inusitado e que é o mercado de arrendamento habitacional. Digo pelos piores motivos, porque quem coloca as suas casas no mercado age em desespero de causa.
Como se sabe, nada foi feito até hoje no sentido de conferir aos proprietários um mínimo de garantias perante um arrendatário faltoso, pelo que ainda hoje arrendar uma habitação se aproxima muito de uma autêntica lotaria. Não fora este “pequeno” detalhe e poderíamos estar perante uma oportunidade séria de dinamização daquele que é certamente o maior segmento do mercado imobiliário – o habitacional - e que por si só encerra um potencial de negócio imenso.
GNR: Se fosse um investidor ou promotor imobiliário, que decisões/estratégias estaria a tomar neste momento?
APA: Estaria a suspender ou a abrandar o ritmo de execução dos projectos onde isso fosse possível e a concluir aqueles que tivesse que concluir. Isto em termos gerais e dependendo naturalmente das perspectivas de colocação dos produtos no curto-prazo. Por outro lado e como investidor, estaria naturalmente atento a oportunidades que possam surgir, privilegiando as operações de rendimento.
GNR: E enquanto gestor de fundos imobiliários, que conselhos dá (daria) aos detentores das UP’s das carteiras que gere?
APA: A esta pergunta é muito difícil responder com total isenção, pois a minha resposta será naturalmente suspeita. Partirei também do princípio de que estaremos a falar de investidores de médio/longo prazo, conhecedores do mercado imobiliário e do produto onde estão investidos. Estas premissas são muito importantes, pois caso contrário seria muito complicado estar aqui a explicar a enorme diferença que existe entre investir num FII (neste caso aberto) e um DP, por exemplo.
Assim e em termos gerais não resgataria a participação nos fundos, quer pela falta de alternativas, quer pela baixa volatilidade que estes apresentam. Mas à falta de melhores argumentos, julgo que será perfeitamente legítimo olhar para trás e comparar aquele que foi o desempenho dos FII’s em geral (índice APFIPP) e o das restantes classes de activos.
A 3 e a 8 anos, em termos de retorno líquido de impostos, o índice APFIPP (que é igualmente líquido das comissões de gestão e de depositário) bate a generalidade dos principais índices de acções (PSI 20 e Eurostoxx geral) e de obrigações (EFFAS), bem como aquele que seria o retorno de um DP a 3 meses aplicado à taxa Euro Libor a 3 meses, renovável ao longo desse período.
GNR: Acha que a legislação actual dos Fundos de Investimento Imobiliário permite aos gestores de carteiras protegerem-se devidamente contra estes tempos de crise e baixa no mercado? Se não, o que acha que está em falta?
APA: Em termos gerais a legislação actual padece de uma má formação de nascença, decorrente do facto de ter sido decalcada da legislação que rege os fundos mobiliários, mesmo apesar das sucessivas alterações que foi sofrendo ao longo dos anos. Diria que às próprias autoridades lhes falta ainda sensibilidade relativamente à realidade que é a gestão de activos imobiliários. E essa falta de sensibilidade é colmatada muitas vezes, infelizmente, através da proibição de determinadas operações, tudo em prol da defesa dos interesses dos participantes.
Aquilo que acharia desejável seria uma maior flexibilidade na gestão dos activos dos fundos, desde que fosse possível demonstrar as vantagens dessas medidas para os participantes em geral. Refiro-me concretamente à não proibição de transacções de imóveis entre FII’s geridos pela mesma sociedade gestora e à possibilidade de se ultrapassarem os limites impostos nos rácios. Mas como nada de verdadeiramente grave aconteceu entretanto, a leitura que irá ser feita certamente, é de que está tudo bem, pelo que não será necessário alterar o que quer que seja.
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António Pena do Amaral é Administrador da F&C Portugal e responsável pelo pelouro imobiliário. Está na empresa há mais de 7 anos.
A F&C Portugal, Gestão de Patrimónios, SA é uma subsidiária detida a 100% pela britânica F&C Asset Management, plc. Dedica-se a 100% à gestão de activos e para além do Reino Unido (Londres e Edimburgo), tem escritórios na Holanda, França, Portugal, Irlanda, Alemanha, EUA, China (Hong-Kong), Escandinávia e Suíça. Para além dos mercados desses países, está ainda presente na Áustria, Nova Zelândia e Espanha.
A 31 de Dezembro geria um total de €102 mil milhões (£98,6 mil milhões), dos quais €8,1 mil milhões em imobiliário (directo e indirecto).
Para os fundos imobiliários, a F&C Portugal actua como consultora de uma sociedade gestora de fundos imobiliários colocados maioritariamente em clientes institucionais e da rede de private banking. Nesse contexto estão incluídos dois fundos, sendo um aberto e outro fechado.
O primeiro fundo, aberto, é um fundo “core” que investe em quase todos os segmentos de mercado, com excepção da habitação. A 31 de Dezembro detinha 110 imóveis ou partes de imóveis, sendo 48.5% destinados a serviços, 27% a comércio, 15,2% a armazéns e indústria e o restante são projectos e terrenos. Em termos geográficos, 57% do seu património concentra-se na região da Grande Lisboa, 13,8% no Grande Porto e o remanescente (29,3%) noutras regiões.
O segundo fundo é um fundo fechado com vocação para o investimento em projectos turísticos e reabilitação urbana. No que respeita aos primeiros (projectos turísticos), está em fase muito adiantada um projecto no Algarve, totalizando 36.000 m² de construção repartidos por 2 hotéis e 1 aldeamento turístico. Relativamente aos segundos (reabilitação urbana) o fundo está ainda em fase de aquisição de um quarteirão na cidade do Porto, onde se prevê a construção de 22.000m² repartidos por comércio, habitação, podendo ainda vir a albergar serviços e/ou hotel e um parque subterrâneo para 760 lugares.
A 31 de Dezembro de 2008 o fundo aberto detinha cerca de €356 milhões em património imobiliário e um património líquido de €310 milhões. O fundo fechado tinha cerca de €57 milhões de capital, dos quais cerca de €37 milhões em imobiliário.
O fundo aberto tem cerca de 2.500 participantes, sendo na sua maioria (em termos de montantes) clientes institucionais (Seguradoras, Fundos de Pensões e outros). Existe também um número significativo de clientes do segmento alto.
10 comentários:
Desta valiosa entrevista com o António Pena do Amaral, tenho os seguintes comentários:
- Sobre os FIIAH: tenho a mesma percepção e vou um pouco mais longe. Parece-me que estes instrumentos servirão, principalmente, para os bancos poderem fazer um spin-off de actividade imobiliária habitacional de alto risco. Retirando alguns activos “incómodos” do balanço, resolvem alguns problemas de rácios de solvabilidade;
- Sobre a situação actual e futura nos FII nacionais, já não estou tão de acordo com o António. A situação económica internacional, e nomeadamente nos mercados financeiros, poderá forçar ao aumento dos resgates nos fundos abertos. Esta pressão poderá ser incómoda para muitos fundos que poderão ver-se obrigados a alienar activos. Esta necessidade, não colmatada pela procura, poderá causar alguns desequilíbrios na indústria;
- Por outro lado, e relativamente aos fundos fechados, não conhecemos o grau de endividamento destes veículos. Para aqueles que estão muito alavancados, podemos chegar à situação em que o NAV destes fundos seja negativo;
- Permitam-me igualmente que diga o seguinte: fico sempre com muitas suspeitas relativamente a produtos financeiros que historicamente apresentam rendibilidades estáveis positivas, e por aqui me fico…
- Por fim, relativamente ao mercado de arrendamento, urge tratar deste assunto. Estamos a perder tempo e oportunidades. Parece-me lógico apostar definitivamente no sector da reabilitação urbana e no arrendamento habitacional, através da conjugação de vontades públicas e privadas. Nesta ordem de ideias, parece-me fundamental permitir ao proprietário despejar um inquilino faltoso com maior celeridade, encontrar meios de obrigar os proprietários que se recusem a reabilitar a fazê-lo, permitir um maior e mais rápido aumento de rendas que sejam muito baixas, proceder a parcerias público-privadas (aqui as Câmaras poderão desempenhar um papel muito importante, auxiliando privados que não têm meios financeiros para levar a cabo obras), entre muitas outras coisas.
Bons negócios (imobiliários)!
Caro Gonçalo,
No que toca aos FIIAH, 10M Eur são uma gota de água no oceano de créditos hipotecários dos bancos e representam cerca de 0,5% do crédito mal parado, pelo que a sua principal utilidade vai ser publicidade e oportunismo político...
Quanto aos resgates exagerados nos fundos abertos, no panorama do imobiliário português são descabidos e fruto de algum pânico por causa do que se passa lá fora (vide exemplo do fundo imobiliário do Santander). Penso que as sociedades gestoras devem apostar na comunicação e procurar transmitir segurança aos participantes. São mto raras as notícias dirigidas aos investidores neste tipo de produtos.
Situações de NAV negativo em fundos imobiliários parece-me complicado, mas só vendo caso a caso. Se viessem a ocorrer, com certeza não se trataria apenas de alavancagem excessiva...
Produtos financeiros com rentabilidade histórica positiva: está em qq bibliografia sobre finanças: OT's, obrigações e imobiliário! Nada de errado aqui.
O que se deveria perguntar é porque razão as rentabilidades nos fundos imobiliários foram tão baixas... estávamos com yields de 6% a 8% no mercado e as rentabilidades dos fundos andavam a metade disso.
De acordo com a questão do arrendamento e da reabilitação urbana, mas cada um desses temas dava para uma newsletter inteira.
parabéns pelo Blog, pela newsletter e pelo esforço em divulgar o Real Estate Finance em Portugal.
um abraço,
JAF
Antes de mais, peço a todos para assinarem os comentários para não aparecer "anónimo". Gostava que todas as opiniões fossem identificadas. Neste caso, por muito que puxe pela cabeça, não estou a ver quem é JAF. Desde já, as minhas desculpas.
Quanto ao resto diria o seguinte:
- Concordo com ideia da gota de água mas o princípio é o mesmo. E parece-me que se perdeu aqui (mais) uma oportunidade fantástica de dinamizar o mercado de arrendamento habitacional. Volto a dizer que sou uma pessoa de ideais e princípios e faz-me imensa pena que se tomem medidas destas por puro oportunismo político;
- Quanto aos resgates dos fundos abertos, estamos de acordo;
- Situações de NAV negativos, não os conheço mas antecipo-os e eles poderão acontecer por 2 razões: excesso de endividamento para um valor actual dos imóveis mais baixo, fruto da descida das expectativas de vendas futuras. A não ser que esteja aqui a empregar mal algumas nomeclaturas de FII's que eventualmente, reconheço, posso desconhecer;
- Quanto à questão das rendibilidades, habituamo-nos desde há já 10-15 anos a ver rendibilidades estáveis de 4%, 5%, 6% nos fundos abertos. Sempre. Sem oscilações. A mim faz-me confusão e os tempos que correm demonstra-nos (e de que maneira!) que o imobiliário também desce, também corrige, também gera menos rendimento num curto espaço de tempo. No último ano, vimos a oscilação no valor das obrigações (já demos aqui exemplo disso) e as OT's julgo que não devem ser comparadas. Essas são risk-free;
- Quanto às yields de 6% a 8%, seriam yields médias do total das carteiras? Talvez não, é natural as carteiras terem imóveis em desenvolvimento, outros devolutos e a maioria, sim, a render 6%, 7% ou 8% brutos. Retirados os custos de gestão e depositário e os devolutos, lá devemos chegar aos valores apontados.
Para finalizar, deixo a promessa de rapidamente abordarmos o tema da reabilitação urbana neste blog.
Bons negócios (imobiliários)!
E o JAF revelou-se-me: João Fonseca, Orey Activos. Um abraço e obrigado pelo comentário!
Aproveito este comentário para explicar a melhor forma de assinarem os vossos comentários: em Comentar como escolhem a opção Nome/URL e digitam o vosso nome, isto para quem não tem nenhum Google ID.
Abraço a todos.
Bom, não podia deixar acabar a semana sem responder a algumas das observações (provocações?) feitas pelo nosso amigo GNR.
- FIIAH: estou de acordo com ambas as perspectivas, mas os montantes são capazes de vir a aumentar, há medida que forem aparecendo mais aderentes;
- Sobre a situação dos FII’s até parece que o Gonçalo está desejoso em ver “sangue”! E se as rendibilidades dos fundos, mesmo que historicamente baixas, forem competitivas, ou seja, se não for absolutamente necessário vender imóveis? E se os imóveis forem postos à venda e não houver compradores, desvalorizam-se até que ponto? Zero? Nesse caso não seria mais sensato suspender os resgates? Ou esperar e ver o que acontece?
- Quanto às suspeitas sobre a estabilidade, bastará olhar para a principal fonte de receita dos FII’s, que são as rendas, que por norma são pagas com regularidade (todos os meses). Não sendo por aí, presumo que se esteja a referir à componente (não claramente explicitada) das valias (mais ou menos / reais ou potenciais), que supostamente poderão introduzir variações positivas ou negativas na rendibilidade. Mas num mercado muito ilíquido como é o imobiliário e mais ilíquido ainda em Portugal, a estabilidade é uma consequência natural, diria mesmo uma característica intrínseca (que às vezes dá jeito). Como tal acho que não deveria ser motivo de suspeita. E isto tanto se aplica às subidas como às descidas. Tudo o resto são variações em “yield” maior ou menor. Acrescente-se aqui um facto pouco discutido que é a reduzida ou nula valorização do imobiliário (mais evidente ao nível dos escritórios) ao longo dos últimos 10 anos (com excepções, naturalmente), o que torna mais difícil a existência de espaço para quedas (a famosa teoria da “bolha”).
- Sobre as contas acerca das rendibilidades é isso mesmo, ou seja, sobre as yields brutas há que descontar 20% de impostos “à cabeça”, os incumprimentos, os espaços devolutos, as despesas de manutenção e de conservação, os seguros, os condomínios, os advogados, as reavaliações, as comissões de gestão, de depósito e de mediação, as auditorias, as taxas de supervisão…
- Por último não posso também deixar de utilizar o velho argumento de que salvo uma catástrofe (e para essas haverá seguros), o activo subjacente a um FII (imóvel) por norma não desaparece, ou seja, terá sempre um valor, ao contrário de muitos outros, que pura e simplesmente se evaporam, como aconteceu nestes últimos meses.
Contem comigo para a reabilitação urbana.
Bom fim-de-semana
Caro António,
Bem sei que foi apenas uma "provocação" mas não estou mesmo nada interessado em "ver sangue". Talvez "lançar algumas achas para a fogueira"...
Agora mais a sério, este blog serve mesmo para isto: colocar questões, dúvidas, diria mesmo, receios. E proporcionar discussão e troca de ideias!
Em termos gerais, concordo com o que diz. Pretendo apenas com este comentário focar 2 aspectos:
- Um primeiro, essencial, que é o valor do imóvel que não desaparece e, como diz e bem, ao contrário de outros! Esta é efectivamente uma característica muito importante do imobiliário: o seu forte Valor Residual. Quem faz avaliações e análises de investimentos imobiliários sabe que a "manipulação" deste valor pode condicionar fortemente o VAL;
- Um segundo aspecto, que em parte é focado no seu comentário e que me leva a colocar uma questão: se os FII's não podem vender imóveis abaixo das médias das avaliações patrimoniais - e sabemos como é que elas são feitas, às vezes com VR's pesados demais - em momentos como o que vivemos, como poderão os FII vender para ter liquidez? Como pode ser feita uma gestão de carteira, para obter liquidez, se o potencial valor de venda está "truncado" por uma avaliação (eventualmente, esticada)?
Quem quiser dar aqui dicas, esperamos por elas!
Bons negócios (imobiliários)!
Caro Gonçalo,
Uma pequena correcção: um FII pode vender um imóvel do seu activo por um valor inferior à média das avaliações (até acontece frequentemente...).
O inconveniente é que se o imóvel estava valorizado pela média das avaliações a venda vai causar uma desvalorização do fundo.
E os participantes podem, legitimamente, perguntar o que se passou...
O DL 60/2002, regime jurídico dos FII's, estabelece no Artº. 28º as situações de conflito de interesse em que um imóvel pode ou não ser vendido, se é necessário autorização da CMVM ou da Assembleia de Participantes e qual o limite máximo ou mínimo de compra ou de venda do imóvel.
um abraço,
João Fonseca
Caro Gonçalo,
Onde é que foi buscar essa idéia de que os FII's não podem vender imóveis abaixo dos valores de avaliação? Onde é que a Lei diz que é proíbido?
Quando muito aquilo que o espera é uma série de pedidos de esclarecimento (CMVM, auditores, investidores...). Comprar acima também não é proíbido, mas aí teria que reconhecer de imediato uma menos-valia, pelo que ninguém no seu perfeito juízo o faz.
Quanto oas valores residuais serem fortes ou fracos, depende dos graus de optimismo de quem os atribui, mas como sabe não é a única variável "manipulável" nas avaliações de projectos.
De forma "desgarrada" as questões de fundo estão lá todas, sem excepção:
1. a pouca sofisticação de muitos subscritores: para o bem (e tb para o mal, como se tem visto) seguem os conselhos dos comerciais dos bancos o que provoca ora excesso de liquidez (que prejudica a rendibilidade em mercados curtos de oportunidades de investimento) ora resgates massivos quer pelo mau aconselhamento quer pela corrida aos DP's como alternativa a investimentos que, de repente, passam a ser de risco. Solução para esta última situação, os FII endividam-se massivamente para fazer face aos resgates o que, com a subida das taxas de juro ajudaria a perceber o resto. Mas como diz o GNR, as rendibilidades não caíram....
2. Alienação de activos: o mercado português é, por definição, um mercado exíguo e onde não existe tradição de alienações entre investidores institucionais - FII, FP, etc - tem a ver muito com a nossa maneira de ser (e de gerir). Vivem assim, muitas vezes, de valores artificiais que podem não corresponder à situação e valorização de mercado, fáceis de perceber se analisarmos a rendibilidade baixíssima de muitos activos na carteira dos FII - o "cash yield" reduz-se na razão inversa da valorização dos activos subjacentes. Por outro lado, o "desaparecimento" de investidores internacionais do mercado nacional fez, infelizmente, o resto;
3. Política de comissionamento: é um absurdo as comissões cobradas por alguns FII e, mais grave do que isso, as valorizações levadas a cabo por alguns daqueles FII cuja remuneração, em parte, deriva de um sucess fee.
4. Recuperação de rendibilidades e dos mercados: tudo irá, mais uma vez, depender do grupo financeiro onde as sociedades gestoras estejam integradas. Grandes grupos, com menores necessidades de liquidez, voltarão a ter como objectivos comerciais a venda de Up's, voltarão a ter liquidez no curto prazo - consequência dos DP's a 1,25% - e passarão a ter, até ao final do ano, condições para determinar as "regras" e as tais yields de mercado que, nesta altura, ninguém sabe o que são. Os mais pequenos, provavelmente, ficarão reféns das tais necessidades de liquidez de alguns bancos depositários. Resta saber se a ausência de liquidez, agravada pelas condições do endividamento já contraído não irá obrigar a novas valorizações... Fiquemos pois atentos à variação dos valores de mercado nos respectivos balanços.
5. Crise económica: ainda faltará saber como irão alguns FII reagir à previsível perda de alguns rendimentos por força das dificuldades em que começam a navegar os arrendatários.
Em resumo, os desafios parecem enormes mas mais uma vez só poderão ser ultrapassados com bom senso e, acima de tudo, muita transparência.
Obrigado pelos esclarecimentos, ao João e ao António, relativamente ao valor de venda dos imóveis detidos por FII's.
É claro que o VR não é a única variável manipulável, há muitas mais. A minha observação veio na sequência do comentário do António.
Da minha experiência, as variáveis que normalmente mais afectam uma avaliação, são (por ordem de importância):
- O tempo. Relacionado com esta, a velocidade de vendas (quando aplicável);
- O custo do capital;
- O valor residual;
- O preço. Deixo-o propositadamente para o fim porque muitas pessoas acham que o preço pode influenciar muito uma avaliação (e influencia, com certeza) mas esquecem todas as outras que, por vezes, são bem mais importantes;
- Entre muitas outras (break-down dos custos, actualização dos mesmos, custo do financiamento, etc.)
Hoje, vende-se muito mais devagar, os investimentos são mais arriscados e o preço baixou. Consequentemente, a expectativa de valor residual também é mais baixa. O valor de um imóvel desce não por uma, mas por quatro razões!
Uma última chamada de atenção para o comentário de "Anónimo": publicamo-o porque está muito completo e é muito importante e interessante mas voltamos a pedir para todos se identificarem.
Bons negócios (imobiliários)!
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