Luís Oliveira é Prof. Auxiliar nas disciplinas de Derivados e Investimentos Financeiros na IBS/ISCTE e Consultor no INDEG/ISCTE.
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Neste pequeno artigo procuro sintetizar algumas das minhas preocupações acerca dos mega-investimentos públicos que se encontram em carteira, designadamente a construção do novo aeroporto de Alcochete e da linha ferroviária de alta velocidade e das respectivas infra-estruturas necessárias à sua implementação.
Apesar de alguns críticos colocarem em causa os méritos e a viabilidade técnica e a premente necessidade destas grandes obras, o nosso governo apresta-se para as realizar e, receio, cometer um erro histórico. A resistência ao debate aberto e a teimosia em prosseguir com obras tão polémicas, no mínimo, deixa-nos a pensar sobre os reais motivos que, provavelmente, estarão na sua origem. Do ponto de vista pessoal, penso que existem algumas questões que considero de primeira importância e sobre as quais, me parece, não terem ainda sido convenientemente equacionadas pelos responsáveis políticos. A saber: a viabilidade económica e financeira do investimento e a viabilidade social do financiamento.
A viabilidade económica e financeira do investimento
Há alguns meses li na imprensa diária uma advertência do Prof. Campos e Cunha chamando a atenção para a necessidade de se repensarem os grandes projectos de investimento público. Sendo economista de formação, sou sensível aos argumentos Keynesianos e Neo-Keynesianos que, em absoluto, defendem a necessidade de grandes investimentos públicos como força motriz da aceleração económica e consequente superação da crise com que o mundo inteiro, actualmente, se debate. Tem algum sentido, mas é importante saber se, do ponto de vista económico, estes projectos de investimento público em carteira são ou não criadores de valor reflectindo-se esse valor no rendimento nacional.
Em linguagem menos técnica, perguntar-se-á se tais investimentos trarão riqueza e bem-estar para o país e para os portugueses? Em última análise, é o nosso dinheiro que está em causa e, por conseguinte, também, ainda que numa muito pequena parte, o meu dinheiro. Daí a legítima preocupação, pois ainda está muito presente na memória dos portugueses a última grande epopeia do investimento público que foi o Euro 2004 e os 10 estádios de futebol. Hoje pouca gente (ou mesmo ninguém) tem dúvidas de que esses investimentos foram amplamente destruidores de valor económico e social e resultaram em pesadas responsabilidades para a geração actual e para as seguintes.
Como sabemos, qualquer projecto de investimento necessita de ser financiado. Um mega-projecto de investimento, necessita de um mega-financiamento. Aqui começam a prefigurar-se alguns dos meus receios. Nos últimos anos, o endividamento ao exterior tem vindo a aumentar na razão directa da diminuição da poupança interna e do aumento dos juros dessa mesma dívida. Segundo alguns insuspeitos economistas que têm vindo a alertar para este grave problema, o aumento do endividamento externo tem sido da ordem dos 8 a 10 por cento do PIB ao ano (a continuar, duplica de 8 em 8 anos). Em resultado, e como acontece naturalmente para instituições, empresas e particulares a dificuldade em cumprir com um serviço da divida crescente é cada vez maior, levando a que o risco financeiro do nosso país cresça em conformidade. A crise financeira internacional é um mero acréscimo porque o nosso problema é estrutural e surgiu muito antes da crise.
A Standard & Poors (S&P) anunciou em Janeiro de 2009 um corte substancial no rating da dívida pública de Portugal, um sinal de que as medidas de reforma estrutural do Governo para a economia e para as finanças públicas têm sido insuficientes para criar condições de convergência ao grupo de países com superior qualidade creditícia. Refira-se, a propósito das similitudes com Portugal, que a Grécia no dia 4 de Março colocou uma emissão de dívida a 10 anos com um cupão de 6%, ou seja, um spread implícito de 300 pontos base face à yield dos 10 anos da dívida soberana da Alemanha. Sublinho, na minha opinião a culpa não é da crise. O país é que não tem capacidade empreendedora para prosseguir com um plano de investimentos tão arrojado. Há cerca de 25 trimestres que “desconvergimos” face à média dos países da UE. Vinte e cinco trimestres correspondem a cerca de seis anos!
Voltemos à questão do financiamento dos mega-projectos. Nas condições actuais, diz o Prof. Campos e Cunha, “dada a estagnação da taxa de poupança, um acréscimo de mil euros de investimento significa que, directa ou indirectamente, serão mais mil euros de endividamento ao exterior”. Termino aqui a citação porque não acredito na parte restante do parágrafo.
Acho que o Professor foi muito benevolente com a análise (bem feita) do problema. Nas condições actuais, e tendo em vista o financiamento dos mega-projectos, duvido que haja capacidade de endividamento por parte do Estado a uma taxa de juro inferior a 8-10 por cento ao ano. Uma vez que planeia financiar os tais mega-projectos com base em parcerias público-privadas, teremos de aumentar um pouco aquela fasquia porque os prémios de risco serão, decerto, substancialmente mais elevados. Admitindo que o mega-montante a financiar seria obtido via mercados de crédito a funcionar “normalmente” e não existindo “restrições de quantidade” [1], penso que o respectivo custo financeiro não ficará abaixo de 12-14 por cento todos os anos, durante muitos anos. Eu sei, corro o risco de, tal como o Prof. Campos e Cunha, ser demasiado optimista quanto a esta estimativa para o custo do financiamento.
Tomando como positivo o incremento dos benefícios económicos e sociais líquidos destes mega-empreendimentos, coloca-se a questão da sua mensuração para, numa base de custo-benefício, contrapor à pesada herança financeira que irá ter de ser suportada. Por enquanto fiquemo-nos apenas pelos méritos económicos que até já foram aferidos por outros brilhantes economistas da nossa praça. Sabendo como é dificil apurar uma taxa de rendibilidade económica e social, admita-se uma rendibilidade apenas económica, antes de encargos financeiros, entre 10-12% ao ano. Nada mal para os tempos que correm, extraordinária, mesmo. Os benefícios para a sociedade decorrentes da implementação dos mega-projectos, traduzidos numa taxa de rendibilidade social, terão de ser muito meritórios para que os mesmos traduzam um valor acrescentado líquido, pelo menos, nulo.
Estou contra o investimento público? Não. Estou contra o mau investimento público. Há alternativas de investimento prioritárias nos chamados sectores estratégicos em relação aos quais temos de selectivamente investir privilegiando questões do tipo: qual o impacto líquido na balança comercial? E na produtividade global do país? E no desenvolvimento de uma indústria competitiva produzindo produtos de elevado valor acrescentado? E, já agora, criadoras de emprego sustentado e qualificado? Tenho dúvidas de que os mega-projectos contemplem satisfatoriamente estes requisitos. A ideia, gasta, keynesiana do abrir e tapar buracos a par do multiplicador do rendimento e da criação de emprego, nos dias de hoje, pode ser uma ideia perigosa. Social e economicamente perigosa. As razões dariam para um novo artigo. Passo à questão seguinte.
A viabilidade social do financiamento
O que vou escrever daqui para a frente é, no mínimo, politicamente incorrecto. Resulta de uma constatação de evidências e factos que ressaltam da observação de uma sociedade, a nossa, na qual deposito pouca esperança. Volto a referir que sou um optimista por natureza e quem me conhece sabe que sim.
Vivemos, ao nível da sociedade global, uma profunda crise de valores os quais estão na base da profunda crise financeira em que o mundo mergulhou. Portugal não escapa. Tanto no que respeita à crise de valores como à crise financeira.
Não me parece que as anteriores gerações de portugueses tenham, nos últimos 20-30 anos, preparado convenientemente as gerações seguintes, por forma a que as responsabilidades futuras de construção e desenvolvimento do país fiquem bem entregues. Um editorial de um diário sobre economia referia que muito dificilmente a classe política poderá convencer as gerações futuras a contribuir para o pagamento das reformas das gerações presentes, se aquelas não estiverem seguras de que também alguém assegurará as suas. Penso que esta questão irá dominar as atenções nos próximos anos.
Com efeito, é notória a constatação de alguns factos que corroem a nossa sociedade, isto é, a actual geração de portugueses: Os alunos que agridem professores. Os Pais, dos alunos que agridem professores, que agridem outros professores. A selvajaria que grassa entre os portugueses e as portuguesas que diariamente circulam no trânsito das principais cidades. Os cidadãos que desrespeitam, com os seus actos e atitudes, tudo e todos. O facilitismo crescente com que se educam os jovens. A (cada vez maior) vergonha nacional que é a justiça do nosso país. O avanço galopante da criminalidade violenta. Os políticos que se agridem verbalmente em pleno parlamento. A corrupção cada vez maior que roça os “mais” responsáveis e inunda os “menos” responsáveis. O avolumar de dívidas e devedores ao fisco ano após ano. A imigração sem regras e, muitas vezes, imposta de fora. Uma classe média de rastos. Uma classe média-baixa no chão. E uma classe baixa na miséria. O abandono dos mais velhos. A demissão de Portugal pelos portugueses. A ausência de uma verdadeira liderança nacional. A ausência de um projecto e de uma estratégia para o país. E podia continuar já que, a este respeito, muito haveria ainda a dizer.
Na minha opinião, a par dos já realizados estudos de viabilidade técnica e económica, seria imprescindível a realização de um, não menos importante, estudo de carácter social que permitisse ter uma, ainda que limitada, ideia da sociedade que temos e da capacidade que as próximas 3-4 gerações terão para suportar as mega-responsabilidades originadas pelos mega-investimento em carteira. Tratar-se-ia de um estudo de viabilidade social do financiamento. O objectivo seria aferir do perfil sociológico da actual geração de portugueses de forma a podermos extrapolar as características dos que lhes irão seguir. Tal perfil poderia definir a existência de traços de cidadania e de civilidade fundamentais para podermos aferir da capacidade das gerações seguintes enfrentarem as responsabilidades e dificuldades que o futuro lhes poderá trazer. A lista de questões a incluir num inquérito-estudo deste tipo seria muito extensa. As conclusões, provavelmente (ou não?), seriam uma grande surpresa. Acredito que o perfil caracterizador dos portugueses que temos não seria abonatório. Imagino o dos que lhes seguirão.
A quem decide ficará reservada a madrasta tarefa de repensar a viabilidade social do financiamento dos novos mega-projectos de investimento. Se decidir não avançar, prestará um excelente serviço ao país e às gerações futuras.
[1] E que os impactos na liquidez dos bancos não se farão sentir ao nível da penúria de crédito para os restantes agentes da economia, não se limitando, assim, a capacidade concorrencial das nossas empresas e a diminuição do consumo interno pela via do crédito às famílias. Na actual conjuntura económica (exiguidade de liquidez acompanhada de uma reduzida rendibilidade económica nos investimentos) é muito provável que este efeito de “crowding-out” se faça sentir.
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Neste pequeno artigo procuro sintetizar algumas das minhas preocupações acerca dos mega-investimentos públicos que se encontram em carteira, designadamente a construção do novo aeroporto de Alcochete e da linha ferroviária de alta velocidade e das respectivas infra-estruturas necessárias à sua implementação.
Apesar de alguns críticos colocarem em causa os méritos e a viabilidade técnica e a premente necessidade destas grandes obras, o nosso governo apresta-se para as realizar e, receio, cometer um erro histórico. A resistência ao debate aberto e a teimosia em prosseguir com obras tão polémicas, no mínimo, deixa-nos a pensar sobre os reais motivos que, provavelmente, estarão na sua origem. Do ponto de vista pessoal, penso que existem algumas questões que considero de primeira importância e sobre as quais, me parece, não terem ainda sido convenientemente equacionadas pelos responsáveis políticos. A saber: a viabilidade económica e financeira do investimento e a viabilidade social do financiamento.
A viabilidade económica e financeira do investimento
Há alguns meses li na imprensa diária uma advertência do Prof. Campos e Cunha chamando a atenção para a necessidade de se repensarem os grandes projectos de investimento público. Sendo economista de formação, sou sensível aos argumentos Keynesianos e Neo-Keynesianos que, em absoluto, defendem a necessidade de grandes investimentos públicos como força motriz da aceleração económica e consequente superação da crise com que o mundo inteiro, actualmente, se debate. Tem algum sentido, mas é importante saber se, do ponto de vista económico, estes projectos de investimento público em carteira são ou não criadores de valor reflectindo-se esse valor no rendimento nacional.
Em linguagem menos técnica, perguntar-se-á se tais investimentos trarão riqueza e bem-estar para o país e para os portugueses? Em última análise, é o nosso dinheiro que está em causa e, por conseguinte, também, ainda que numa muito pequena parte, o meu dinheiro. Daí a legítima preocupação, pois ainda está muito presente na memória dos portugueses a última grande epopeia do investimento público que foi o Euro 2004 e os 10 estádios de futebol. Hoje pouca gente (ou mesmo ninguém) tem dúvidas de que esses investimentos foram amplamente destruidores de valor económico e social e resultaram em pesadas responsabilidades para a geração actual e para as seguintes.
Como sabemos, qualquer projecto de investimento necessita de ser financiado. Um mega-projecto de investimento, necessita de um mega-financiamento. Aqui começam a prefigurar-se alguns dos meus receios. Nos últimos anos, o endividamento ao exterior tem vindo a aumentar na razão directa da diminuição da poupança interna e do aumento dos juros dessa mesma dívida. Segundo alguns insuspeitos economistas que têm vindo a alertar para este grave problema, o aumento do endividamento externo tem sido da ordem dos 8 a 10 por cento do PIB ao ano (a continuar, duplica de 8 em 8 anos). Em resultado, e como acontece naturalmente para instituições, empresas e particulares a dificuldade em cumprir com um serviço da divida crescente é cada vez maior, levando a que o risco financeiro do nosso país cresça em conformidade. A crise financeira internacional é um mero acréscimo porque o nosso problema é estrutural e surgiu muito antes da crise.
A Standard & Poors (S&P) anunciou em Janeiro de 2009 um corte substancial no rating da dívida pública de Portugal, um sinal de que as medidas de reforma estrutural do Governo para a economia e para as finanças públicas têm sido insuficientes para criar condições de convergência ao grupo de países com superior qualidade creditícia. Refira-se, a propósito das similitudes com Portugal, que a Grécia no dia 4 de Março colocou uma emissão de dívida a 10 anos com um cupão de 6%, ou seja, um spread implícito de 300 pontos base face à yield dos 10 anos da dívida soberana da Alemanha. Sublinho, na minha opinião a culpa não é da crise. O país é que não tem capacidade empreendedora para prosseguir com um plano de investimentos tão arrojado. Há cerca de 25 trimestres que “desconvergimos” face à média dos países da UE. Vinte e cinco trimestres correspondem a cerca de seis anos!
Voltemos à questão do financiamento dos mega-projectos. Nas condições actuais, diz o Prof. Campos e Cunha, “dada a estagnação da taxa de poupança, um acréscimo de mil euros de investimento significa que, directa ou indirectamente, serão mais mil euros de endividamento ao exterior”. Termino aqui a citação porque não acredito na parte restante do parágrafo.
Acho que o Professor foi muito benevolente com a análise (bem feita) do problema. Nas condições actuais, e tendo em vista o financiamento dos mega-projectos, duvido que haja capacidade de endividamento por parte do Estado a uma taxa de juro inferior a 8-10 por cento ao ano. Uma vez que planeia financiar os tais mega-projectos com base em parcerias público-privadas, teremos de aumentar um pouco aquela fasquia porque os prémios de risco serão, decerto, substancialmente mais elevados. Admitindo que o mega-montante a financiar seria obtido via mercados de crédito a funcionar “normalmente” e não existindo “restrições de quantidade” [1], penso que o respectivo custo financeiro não ficará abaixo de 12-14 por cento todos os anos, durante muitos anos. Eu sei, corro o risco de, tal como o Prof. Campos e Cunha, ser demasiado optimista quanto a esta estimativa para o custo do financiamento.
Tomando como positivo o incremento dos benefícios económicos e sociais líquidos destes mega-empreendimentos, coloca-se a questão da sua mensuração para, numa base de custo-benefício, contrapor à pesada herança financeira que irá ter de ser suportada. Por enquanto fiquemo-nos apenas pelos méritos económicos que até já foram aferidos por outros brilhantes economistas da nossa praça. Sabendo como é dificil apurar uma taxa de rendibilidade económica e social, admita-se uma rendibilidade apenas económica, antes de encargos financeiros, entre 10-12% ao ano. Nada mal para os tempos que correm, extraordinária, mesmo. Os benefícios para a sociedade decorrentes da implementação dos mega-projectos, traduzidos numa taxa de rendibilidade social, terão de ser muito meritórios para que os mesmos traduzam um valor acrescentado líquido, pelo menos, nulo.
Estou contra o investimento público? Não. Estou contra o mau investimento público. Há alternativas de investimento prioritárias nos chamados sectores estratégicos em relação aos quais temos de selectivamente investir privilegiando questões do tipo: qual o impacto líquido na balança comercial? E na produtividade global do país? E no desenvolvimento de uma indústria competitiva produzindo produtos de elevado valor acrescentado? E, já agora, criadoras de emprego sustentado e qualificado? Tenho dúvidas de que os mega-projectos contemplem satisfatoriamente estes requisitos. A ideia, gasta, keynesiana do abrir e tapar buracos a par do multiplicador do rendimento e da criação de emprego, nos dias de hoje, pode ser uma ideia perigosa. Social e economicamente perigosa. As razões dariam para um novo artigo. Passo à questão seguinte.
A viabilidade social do financiamento
O que vou escrever daqui para a frente é, no mínimo, politicamente incorrecto. Resulta de uma constatação de evidências e factos que ressaltam da observação de uma sociedade, a nossa, na qual deposito pouca esperança. Volto a referir que sou um optimista por natureza e quem me conhece sabe que sim.
Vivemos, ao nível da sociedade global, uma profunda crise de valores os quais estão na base da profunda crise financeira em que o mundo mergulhou. Portugal não escapa. Tanto no que respeita à crise de valores como à crise financeira.
Não me parece que as anteriores gerações de portugueses tenham, nos últimos 20-30 anos, preparado convenientemente as gerações seguintes, por forma a que as responsabilidades futuras de construção e desenvolvimento do país fiquem bem entregues. Um editorial de um diário sobre economia referia que muito dificilmente a classe política poderá convencer as gerações futuras a contribuir para o pagamento das reformas das gerações presentes, se aquelas não estiverem seguras de que também alguém assegurará as suas. Penso que esta questão irá dominar as atenções nos próximos anos.
Com efeito, é notória a constatação de alguns factos que corroem a nossa sociedade, isto é, a actual geração de portugueses: Os alunos que agridem professores. Os Pais, dos alunos que agridem professores, que agridem outros professores. A selvajaria que grassa entre os portugueses e as portuguesas que diariamente circulam no trânsito das principais cidades. Os cidadãos que desrespeitam, com os seus actos e atitudes, tudo e todos. O facilitismo crescente com que se educam os jovens. A (cada vez maior) vergonha nacional que é a justiça do nosso país. O avanço galopante da criminalidade violenta. Os políticos que se agridem verbalmente em pleno parlamento. A corrupção cada vez maior que roça os “mais” responsáveis e inunda os “menos” responsáveis. O avolumar de dívidas e devedores ao fisco ano após ano. A imigração sem regras e, muitas vezes, imposta de fora. Uma classe média de rastos. Uma classe média-baixa no chão. E uma classe baixa na miséria. O abandono dos mais velhos. A demissão de Portugal pelos portugueses. A ausência de uma verdadeira liderança nacional. A ausência de um projecto e de uma estratégia para o país. E podia continuar já que, a este respeito, muito haveria ainda a dizer.
Na minha opinião, a par dos já realizados estudos de viabilidade técnica e económica, seria imprescindível a realização de um, não menos importante, estudo de carácter social que permitisse ter uma, ainda que limitada, ideia da sociedade que temos e da capacidade que as próximas 3-4 gerações terão para suportar as mega-responsabilidades originadas pelos mega-investimento em carteira. Tratar-se-ia de um estudo de viabilidade social do financiamento. O objectivo seria aferir do perfil sociológico da actual geração de portugueses de forma a podermos extrapolar as características dos que lhes irão seguir. Tal perfil poderia definir a existência de traços de cidadania e de civilidade fundamentais para podermos aferir da capacidade das gerações seguintes enfrentarem as responsabilidades e dificuldades que o futuro lhes poderá trazer. A lista de questões a incluir num inquérito-estudo deste tipo seria muito extensa. As conclusões, provavelmente (ou não?), seriam uma grande surpresa. Acredito que o perfil caracterizador dos portugueses que temos não seria abonatório. Imagino o dos que lhes seguirão.
A quem decide ficará reservada a madrasta tarefa de repensar a viabilidade social do financiamento dos novos mega-projectos de investimento. Se decidir não avançar, prestará um excelente serviço ao país e às gerações futuras.
[1] E que os impactos na liquidez dos bancos não se farão sentir ao nível da penúria de crédito para os restantes agentes da economia, não se limitando, assim, a capacidade concorrencial das nossas empresas e a diminuição do consumo interno pela via do crédito às famílias. Na actual conjuntura económica (exiguidade de liquidez acompanhada de uma reduzida rendibilidade económica nos investimentos) é muito provável que este efeito de “crowding-out” se faça sentir.
2 comentários:
Relativamente ao Artigo do Professor Luís Oliveira, que me parece bastante pertinente, apresento ao forum os seguintes pontos, em jeito de comentário:
1) Também não sou mto favorável a mega investimentos, porque quando falham são geradores de grandes elefantes brancos, todavia reconheço que alguns me surpreenderam pela positiva, o mais surpreendente foi o da Expo, que parecia ter tudo para ser um fracasso e hoje é unanime que financeiramente não foi um desastre (apesar de ter alimentado mta gente!!) como até foi um exemplo quando comparado com Sevilha e outros ... e do ponto de vista social é inequivoco que é um sucesso. Outro bom exemplo é a ponte Vasco da Gama que custou 800 milhões mas é uma obra fantástica e viável financeira e socialmente pelos beneficios e qualidade de vida que proporcionou às populações. Nestes dois casos o que parecia uma estupidez de gastos acabou por ser diluido no tempo e hoje constatamos que foram baratos.
2) Entre o Aeroporto e o TGV, penso que ambos carecem de estudos de viabilidade tendo em conta a estratégia e a viabilidade financeira. parece-me que o aeroporto poderá ser interessante se de facto nos posicionarmos como plataforma de transporte entre a europa e Africa/America do Sul, mas para isso tem de se criar um conjunto de vantagens competitivas que tornem esta plataforma uma verdadeira charneira imbatível. Para o TGV parece-me mais dificil de justificar o investimento e concordo integralmente com o autor (o unico argumento favorável é a nossa ligação á europa e o não isolamento, mas... a que preço). Todavia, se houver uma estratégia de negócio e esta for bem aplicada penso que ambos os projectos poderão ser financeiramente justificados.
3) Tal como é referido, no momento actual o custo do dinheiro para o estado português deveria ser de 8 a 10% (na melhor das hipóteses o que provávelmente inviabilizaria o investimento), mas como o mercado de crédito não parece estar a funcionar eficientemente e com todo o dinheiro que está a ser printado no mundo (para evitar deflações), talvez esta seja a janela de oportunidade para fazermos as obras, isto porque i)o nível de Depósitos existentes é enorme ii) o mercado não está a preçar o dinheiro de forma correcta dado que os BC's estão a comprar divida publica dos estados e consequentemente o custo do dinheiro é bastante abaixo do custo esperado. Também do ponto de vista orçamental temos oportunidade de fazer as obras dado que todos estão mais laxistas aos déficies orçamentais (vamos lá transgredir que a polícia está de greve!)
4) é evidente que este investimento vai ter de ser pago e por isso as gerações futuras terão mais dificuldades em fazer face a estas dividas, daí que a minha maior preocupação seria mais a de arranjar uma estratégia empresarial adequada que justifique e viabilize o investimento. E assim sendo não estaria tão negativo quanto o autor.
5) no que diz respeito à anàlise da sociedade estou inteiramente de acordo com o autor "onde é que isto vai parar???". Talvez o problema esteja na mediocridade dos nossos politicos, mas... não somos nós que os elegemos?
"Comentador de Bancada - António Dias"
Após a leitura deste artigo do Prof. Luís Oliveira e do que foi escrito por António Dias, tenho os seguintes comentários a fazer:
- Em primeiro lugar, dizer-vos que as declarações efectuadas pelo Sr. Presidente da República, relativamente a esta matéria, são simples e pertinentes. Tudo parte de uma análise custo-benefício que tem de ser feita;
- Continuo sem encontrar grande justificação, estratégica, económica e financeira, para avançarmos para o projecto do TGV. No limite, parecer-me-ia justificável, em termos de produto e estratégia, uma ligação ao Porto e à Galiza. Mais do que isso…
- Por muito que me custe “aceitar” o volume de investimento necessário para construirmos um novo aeroporto, sou mais sensível aos argumentos a favor do mesmo. Entendo a necessidade estratégica de nos constituirmos como um hub de ligação para África e América do Sul e de não nos tornarmos num “aeroporto satélite” de Madrid. O que me preocupa é que depois ninguém vai dar continuidade a esta ideia e criar reais vantagens comparativas em Portugal para nos assumirmos com um verdadeiro elo de ligação entre a Europa, África e América do Sul. O importante é o betão, o resto já não é tão importante assim;
- Uma 3ª travessia sobre o Rio Tejo - numa altura em que as estimativas de tráfego da Ponte Vasco da Gama não foram ainda atingidas e que a sua viabilização económica e financeira, num prazo útil, não é ainda certa – parece-me um investimento desmesurado e “fora de contexto”;
- Mais que tudo, nos tempos que correm, em que necessitamos de investimento público de qualidade, que tenha um efeito multiplicador na economia de curto prazo, (quase) todos os argumentos a favor deste grandes investimentos públicos caem por terra. Os planos de investimento, públicos ou privados, devem ser adequados face a condicionantes externas (para além das internas, obviamente);
- O custo actual e futuro de todos estes investimentos é muito elevado. O risco dos Estados é cada vez maior, colocando a fasquia do “risk-free” cada vez mais elevada. Isto tem consequências no custo do financiamento de todos estes investimentos públicos, como também tem influência directa no custo do financiamento das empresas privadas. Isto significa que estas decisões de investir nestes projectos megalómanos, influencia duplamente as gerações futuras: porque serão elas a pagar todos estes desvarios e condicionarão as empresas no seu crescimento, por via de um financiamento cada vez mais caro;
Adicionalmente, gostaria de deixar aqui a minha singela opinião sobre aquilo que o Estado deveria estar mais concentrado em fazer, em matéria de investimento público:
- Em primeiro lugar, parece-me que deveríamos estar a apostar na reabilitação urbana. Aqui imperaria uma lógica keynesiana mas também social. Porque não começarmos a demolir imóveis devolutos e em ruínas? Reabilitar parque edificado para arrendamento? Construir jardins, parques infantis? Reabilitar os centros das cidades? Porque não criar um gabinete ministerial que se relacione com a Associação Nacional dos Municípios para fazer um levantamento rápido em matéria de reabilitação? Porque não constituir Fundos de Reabilitação com a participação do Estado, das Câmaras e de Privados?
- Em segundo lugar, acho que temos necessidades internas bastante mais importantes que um TGV ou investimento similar: renovação do parque escolar, construção de uma rede pública para o pré-escolar, por exemplo. Investimento multiplicador, com efeitos económicos e sociais e dos quais nós necessitamos;
- Em terceiro lugar, e já aqui o referi uma vez, temos de pensar em como sair desta situação. De uma vez por todas, temos de ser prospectivos e procurar saber onde e como queremos estar no futuro.
Por fim, e quanto à questão mais social, estou profundamente de acordo que vivemos uma enorme crise de valores. As pessoas andam “distraídas” com muita coisa e esquecem-se do essencial. Quem deveria dar o exemplo, também não ajuda. Não vou ocupar o espaço deste blog sobre este assunto mas todos os dias vejo uma sociedade que se degrada mais e mais…
Um abraço a todos e bons negócios (imobiliários)!
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