menu

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Dinheiro parado é dinheiro que rende (2)?

Por Gonçalo Nascimento Rodrigues
Out of the Box
Main Thinker

OTBX, Consultoria em Finanças Imobiliárias, Lda.
Managing Director






--

No meu artigo anterior, apresentava a rentabilidade da opção de ter o dinheiro “parado” no Banco.

Como disse, existe hoje em dia em Portugal uma “corrente de pensamento” que justifica a opção de investimento em imóveis como sendo preferível a ter o dinheiro “parado”.

Tal como vimos no post anterior, parece até ser uma verdade "la palisse". Mais risco, mais retorno. Mas no final do dia, compensará mesmo correr esse risco?

Olhemos então para o caso Português. Procurei calcular e comparar a rentabilidade de um investimento em depósitos, obrigações do tesouro Portuguesas e imobiliário, entre os anos de 2001 e 2011*. Todos os dados foram retirados do INE – Instituto Nacional de Estatística – e do Banco de Portugal, tendo sido assumidos os seguintes pressupostos:

  • A taxa de juro assumida foi a taxa de juro de depósitos a prazo sobre os saldos anuais das Outras Instituições Financeiras e Monetárias (OIFM);
  • O cupão gerado por uma OT, em 2001, assumiu-se como sendo idêntico à yield desse mesmo ano (5%);
  • Para a valorização do imobiliário, foram comparadas 2 séries diferentes: o valor médio de venda de prédios urbanos em propriedade horizontal (VMPT) e o valor médio de avaliação bancária (VMAB);
  • Para cálculo das rentabilidades líquidas, foram assumidos os seguintes valores:
    • Taxa média de imposto sobre juros de depósitos a prazo e OT’s: 25%;
    • Taxa média de imposto sobre rendas imobiliárias: 40%;
    • Imposto sobre aquisição de um imóvel em 2001 (SISA): 10%;
    • Custos relacionados com a propriedade imobiliária: 25% das rendas;
  • Para cálculo das rentabilidades reais foi assumido o Índice Harmonizado de Preços ao Consumidor.

A valorização do imobiliário em Portugal apresenta conclusões bastante diferentes consoante a métrica usada, como podemos verificar no gráfico seguinte:

Fonte: INE

O valor médio de venda de prédios urbanos em propriedade horizontal apresenta uma variação muito maior do que o valor médio de avaliação bancária, bastante mais estável ao longo dos 10 anos em análise.

Apesar de não querer entrar em grandes discussões sobre tamanha diferença, aponto apenas uma simples razão para isto acontecer: a primeira variável resulta de dados fornecidos pelos Notários. Como bem sabemos, foi prática em Portugal, durante muitos anos, escriturar imóveis por valores muito inferiores aos reais como forma de reduzir o impacto fiscal da transacção. Essa prática tem-se reduzido substancialmente nos últimos anos, aproximando esta variável aos valores reais de transacção. Daí verificarmos tamanha oscilação em tão curto espaço de tempo.

As conclusões relativamente às rentabilidades obtidas nos 3 activos investidos apresentam-se no seguinte gráfico:

Fonte: INE, Banco de Portugal
Tratamento: Out of the Box

Como podemos verificar, das 3 classes de activos analisadas, o imobiliário é aquele que tem maior rentabilidade bruta e nominal (ou seja, não inclui impostos, custos nem é descontado da inflação).

Quando calculada a rentabilidade com impacto fiscal e custos de propriedade, gestão e manutenção, a rentabilidade dos activos imobiliários decresce bastante comparativamente com os restantes activos. Em termos reais, reduz-se ainda mais.

No caso da variável Valor Médio de Avaliação Bancária, a rentabilidade líquida e real de um activo imobiliário é inclusive inferior à de um depósito a prazo.

Ou seja, será justo dizer que no longo prazo - o que muita teoria imobiliária e financeira também o diz - o imobiliário replica a inflação, podendo ser mais ou menos rentável consoante os ciclos económicos (dependendo dos momentos de entrada e saída) e do quadro fiscal inerente.

Conseguimos concluir exactamente isso no nosso exercício: no caso do VMPT, bate a inflação em 2 pontos percentuais (p.p.); no caso do VMAB, fica 1,3 p.p. abaixo da inflação.

O momento de entrada e saída é determinante na rentabilidade de um investimento imobiliário (algo que não acontece nos restantes investimentos analisados, assumindo-se a detenção até à maturidade). Aliás, comparando um imóvel com, por exemplo, uma OT, perante yields similares, pesará com certeza na rentabilidade do investimento o ganho de capital (valor de venda – valor de compra). É o chamado, risco de valor residual.

E como podemos verificar no exercício realizado, obtendo um ganho de capital substancial – no caso do VMPT, uma valorização de 50% em 10 anos – a rentabilidade líquida e real foi de apenas 2%. Já pressupondo uma maior estabilidade do valor do imóvel – no caso do VMAB, uma valorização de apenas 3% em 10 anos – a rentabilidade é pior do que um depósito a prazo.

Não me parece, assim, justo dizer que o "dinheiro parado" desaparece, ao passo que um imóvel valoriza sempre. Porque, simplesmente, não é verdade. Como vimos, a falácia é facilmente desconstruída:

  • O juro num depósito a prazo (DP) pode ser composto, melhorando relativamente a rentabilidade desta opção de investimento;
  • O risco de valor residual - o que consigo recuperar no fim do prazo de investimento - é substancialmente inferior num DP do que num imóvel. Aliás, esse risco é igualmente inferior, em muitos casos, na opção de investimento em obrigações, dada a iliquidez típica de um activo imobiliário;
  • Esse mesmo risco de valor residual tem um impacto substancial na rentabilidade de um investimento imobiliário;
  • Um activo imobiliário comporta mais custos do que deter um depósito;
  • Tradicionalmente, o impacto fiscal de um investimento imobiliário é bastante superior à de um depósito.

Em conclusão, afinal até pode não ser tolice ter o dinheiro “parado” no Banco, dependendo do momento em que nos encontramos no ciclo económico. Dependerá, igualmente, das expectativas geradas pelo investidor relativamente ao futuro.

Investir em imóveis é muito mais do que yields ou outros percentuais quaisquer: é um investimento muito local, diferente de cidade para cidade, de rua para rua, requer conhecimento, gestão, dedicação, profissionalismo e a sua rentabilidade depende bastante da valorização, do ganho de capital.

Bons negócios (imobiliários)!

--

* Uma análise mais correcta implica uma série bastante mais longa do que apenas 10 anos.

Sem comentários: