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segunda-feira, 23 de agosto de 2010

O Investimento Imobiliário em Portugal e no Mundo

Deixo-vos hoje o mais recente artigo que escrevi para a Revista Imobiliária.

Enjoy!
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Uma Retrospectiva
O ano de 2009 foi um ano de enorme escassez de capitais investidos no mercado imobiliário em todo o Mundo. Portugal, naturalmente, não fugiu à regra.

Antes de nos debruçarmos sobre o ano que passou e o corrente, há que fazer alguma retrospectiva para entendermos o que se passou e quais foram os principais drivers do investimento imobiliário mundial.

Na realidade, nos 5 anos anteriores a 2008, o mercado foi dinamizado fundamentalmente por dívida bancária. A maior parte dos montantes investidos provinham de financiamentos bancários, cabendo uma cada vez menor fatia do investimento ao próprio investidor. Com isto, foram rapidamente ultrapassados níveis considerados saudáveis de endividamento, tornando-se incomportáveis com a queda acentuada dos valores dos activos em 2008.

O cenário hoje alterou-se: as regras no investimento imobiliário são ditadas pelo equity (capitais próprios) e não por debt (dívida, capitais alheios), sendo o primeiro naturalmente mais “caro” que o segundo. Ora se é mais caro, é expectável que os rendimentos (yield) exigidos por esse investimento sejam também mais elevados. Se o investidor exige um rendimento superior para realizar um investimento, então estará disposto a pagar menos por esse investimento. Existe uma relação inversa entre valor e yield: se a segunda sobe, o primeiro desce e vice-versa.

Podemos constatar isto mesmo no gráfico que se segue, onde observamos claramente uma subida das yields na Europa durante 2008 e 2009, tendo atingido uma subida máxima de 50 basis point no sector de escritórios:

Fonte: CBRE

Assim, entre 2008 e 2009, observamos um congelamento quase absoluto no financiamento ao mercado imobiliário, escassez de capitais disponíveis para investir e maior exigência no rendimento e no tipo de produto. O mercado centrou-se em produtos prime, nas melhores localizações, com os melhores tenants (ocupadores). Procurou-se baixo risco, rendimento “seguro” e um preço atractivo. O investidor tornou-se mais exigente, mais qualificado e o mercado ajustou-se.

O Investimento Imobiliário Mundial

De acordo com o International Investment Atlas da Cushman & Wakefield, em 2009 observamos um decréscimo de 23% nos montantes globalmente investidos no mercado imobiliário (face a 2008), tendo sido este o valor mais baixo desde 2003. Os 365 mil milhões de dólares investidos foram em muito suportados pelo mercado imobiliário chinês, que concentrou 39% desse valor, seguidos do Reino Unido e dos Estados Unidos.

Há a realçar o facto da China se ter tornado no maior mercado mundial de investimento imobiliário em 2009, ao ter observado um crescimento nos montantes totais investidos entre 2008 e 2009 de cerca de 150%, ao passo que os Estados Unidos registaram um decréscimo de mais de 60%.

Fonte: CWHB

Já em 2010, e ainda segundo a CB Richard Ellis, o mercado europeu começou já a recuperar. Esta consultora estima que neste ano seja superada a fasquia dos 100 mil milhões de euros de investimento, face aos 73 mil milhões de euros registados em 2009.

Durante o 1º trimestre de 2010, o volume de investimento no imobiliário comercial europeu atingiu os 19,1 mil milhões de euros, um acréscimo de 65% face aos 11,6 mil milhões de euros transaccionados no período homólogo. Esta subida foi impulsionada por um aumento na confiança dos investidores e uma recuperação nos key indicators dos principais países da Zona Euro. Este aumento foi igualmente induzido pelo sector de retalho, com uma quota de 42% ultrapassando a percentagem de investimento em activos de escritórios.

Há, no entanto, a registar um acréscimo dos financiamentos ditos secundários, como os mezzanine, mercado que estava completamente congelado desde finais de 2008. Desde essa data, o sector financeiro só “fornecia” (e a menor escala) primary loans ou senior debt, a dívida mais “segura” que existe no mercado (já que é coberta pelo próprio imóvel). No 1º trimestre de 2010, começamos a observar alguma disponibilidade no sector financeiro em emprestar dinheiro assumindo mais algum risco, providenciando mezzanines, secondary loans ou outro tipo de dívida mais estruturada. Esta dívida comporta um risco bastante superior, dado que é coberta geralmente pelas acções da própria empresa. Significa isto que caso o investidor entre em default nos pagamentos de uma dívida secundária, o financiador torna-se investidor. Logo, é natural que exija uma rendibilidade superior ao juro cobrado pelo banco.

De acordo com a Jones Lang Lasalle, estima-se que no mercado imobiliário norte-americano tenha havido um financiamento total por mezzanines ou secondary loans de 374 milhões de dólares, significando um acréscimo de cerca de 80% face ao mesmo período de 2009.

O Investimento Imobiliário em Portugal

Quanto a Portugal, a actividade de investimento imobiliário também sofreu os efeitos da crise que atingiu a quase totalidade das economias mundiais. Em linha com o sucedido em 2008, o ano que passou também não trouxe boas notícias para o mercado de investimento. Segundo a Cushman & Wakefield, Portugal registou em 2009 um total de 537 milhões de euros em negócios de investimento imobiliário, um valor muito semelhante ao registado em 2008 mas muito aquém dos montantes registados em 2006 e 2007 (em 2008 e 2009 observamos um decréscimo de mais de 50% face a 2007). A maior parte do investimento realizado em 2009 foi direccionado para os sectores de escritórios e retalho, tendo estes concentrado 60% do total dos valores investidos.

À luz do ocorrido a nível europeu, as yields observaram um aumento entre 2008 e 2009. De acordo com a CB Richard Ellis, as prime yields de escritórios, depois de um mínimo de 5% em 2007, atingiram o valor de 7% no final de 2009, uma subida de 40% em apenas 2 anos.

De acordo com o Investment Property Databank (IPD), o retorno total dos investimentos imobiliários realizados em Portugal em 2009 foi nulo. Apesar da componente de rendimento associado ao retorno do investimento ter sido positiva (6,1%), a realidade é que a desvalorização dos activos anulou esse valor (- 5,7%). Se olharmos para os resultados obtidos nos anos anteriores, rapidamente concluímos que, de facto, foi a desvalorização dos activos que afectou a rendibilidade das carteiras dos investidores em Portugal nos últimos 2 anos:

Fonte: IPD

Uma tendência que temos vindo a observar no mercado nacional é da tomada de investimento imobiliário pelos chamados family offices, ou seja, investidores familiares, de menor dimensão que os Fundos de Investimento ou Investidores Institucionais. De certa forma, esta categoria de investidores ressurgiu no mercado devido ao aumento das yields. Quando antes tinham muita dificuldade em competir com os outros investidores – com mais capital disponível, maior capacidade de alavancagem e dispostos a assumir um maior grau de risco – hoje, com algum capital disponível conseguem comprar ao preço e yield oferecidos. Face ao risco e volatilidade dos restantes mercados de capitais – fundamentalmente nas acções e obrigações – esta classe de investidores tem mostrado bastante interesse em investir no mercado imobiliário, agora que é possível obter investimentos a preços mais razoáveis e yields superiores.

Segundo um inquérito realizado pelo IPD, os investidores inquiridos planeiam investir em Portugal, em 2010, um total de 718 milhões euros, sendo que 42% desse valor será direccionado para escritórios na CBD ou numa outra zona considerada prime de Lisboa. No fundo, para 2010 os investidores mantêm a sua orientação para investimentos seguros.

E o Futuro? O que nos reserva?

Apesar de estarmos a verificar alguma recuperação no mercado, que aliás vem já do 2º semestre do ano passado, a verdade é que os mercado mantém muita da turbulência e volatilidade a que nos habituamos já desde finais de 2007. Hoje em dia, a componente de dívida soberana dos Estados tem influenciado bastante o comportamento dos mercados financeiros, sendo que o mercado imobiliário naturalmente não escapará aos efeitos adversos da subida das yields das obrigações do tesouro dos Estados Europeus. Tal como se devem recordar, na edição de Janeiro desta mesma revista, quando procurei efectuar uma antevisão do presente ano, desde logo chamei a atenção para esta tendência de subida do risco da dívida soberana, muito antes dos recentes movimentos especulativos em torno da mesma.

Por outro lado, a recente alteração legislativa, no que concerne à eliminação dos benefícios fiscais para os Fundos de Investimento Imobiliário Fechados, pode vir travar alguma dessa recuperação. Segundo o Barómetro Out of the Box do mês de Maio, uma esmagadora maioria de 73,9% dos leitores acreditava que o fim desses benefícios fiscais seria prejudicial para o investimento imobiliário em Portugal, vindo a dificultar ainda mais a (re)entrada de investidores ditos institucionais no nosso mercado.

Bons negócios (imobiliários)!

2 comentários:

Unknown disse...

Boa tarde,
Antes de mais parabéns pelo excelente artigo, que me parece muito bem fundamentado.
Gostaria de saber a sua opinião acerca do mercado de habitações em Portugal, e do que o futuro lhe possa reservar. Este é um assunto delicado, muitas vezes trazido a público de forma distorcida por todos os interesses que lhe estão subjacentes.
Fala-se hoje em dia numa recuperação progressiva nos meios de comunicação social, no momento "ideal" para comprar casa. Na minha modesta opinião poderá ser demasiado cedo para o fazer, principalmente devido às especificidades do mercado imobiliário Português. Dados históricos apontam para que após uma crise, o ponto mais baixo do preço médio das casas seja atingido no 7º ano após esta ter ocorrido. Penso que também desta vez poderemos assistir à repetição deste fenómeno. O conservadorismo de quem possui habitações para venda impede que se venda a perder, aguentando-se até onde se pode o empréstimo à banca (esta é, na minha opinião, uma das razões para a descida mais ligeira do que nos restantes países da Europa do preço das habitações). Caso o acesso ao crédito continue a ser dificultado, existirá menos procura e a oferta continuará a acumular-se. Quando a Euribor começar a ascender novamente, os proprietários (privados e pequenas empresas) terão dificuldades em manter empréstimos que não estão a gerar retornos e nessa fase poderemos assistir a um sell-off neste mercado.
O que acha disto?
Com os melhores cumprimentos,
Tiago Esteves

Unknown disse...

Se preferir responder-me de forma não pública, pode fazê-lo para tiago.s.esteves@gmail.com. De qualquer forma gostaria de ter a sua opinião sobre este assunto